Mauro Pandolfi
Futebol é um teatro de grama e paixão. É revelado por vários olhares. O
mais encantador é o poético. Quando o lance, o drible, o gol, tem o ritmo, a sonoridade, é
recitado como poesia. O lance alado descrito por Chiko Kuneski tem um devaneio
niilista. É tão sublime que sobrepõe o gol. Chiko brinca com a arte e a física. Gosta tanto de Bukowski que
busca inspiração da individualidade múltipla de Fernando Pessoa. Ele foi Álvaro de Campos.
Sutileza, suavidade, magia em descrever a jogada sem se preocupar com o
todo. A beleza inventada por Ibrahimovic é a mais relevante que a
vitória. O poeta flerta com a gravidade. Tira o peso da bola, transforma
numa peteca, que flutua leve, sem se preocupar com sentido, até
adormecer na rede. Ibrahimovic pode ser um heterônimo de Pessoa. Mas, o gol alado, que
não vi, é do Chiko.
Há
jogos que a poesia não está nos lances pictóricos. Foge das asas da
chuteira. A poesia surge nos rostos triscados, na bravura, na
insistência. Os versos são mais épicos do que líricos, sem perder a
beleza e o romantismo. Norwich e Liverpool fizeram uma partida destas. A
bola não ficou leve como uma peteca, etérea nos pés bailarinos de
Roberto Firmino. Sim, pesada, densa, dura, traiçoeira. A busca do
goleiro, no
passe curto demais, que Milner intercepta, é a essência do jogo. A
distração, o erro, a fatalidade. Um jogo ganho pela perseverança criada
por um treinador, Jurgen Klopp. que recusa a derrota, que fustiga a
vitória, um belo artesão de times..
Um jogo fragmentado. Ora, bem jogado. Lances elaborados numa planilha,
movimentos individuais ousados e inventado na hora. O talento de
Roberto Firmino resplandeceu com gol e assistência. Também, uma partida
decidida em erros bisonhos, chutões, correria, loucas escapadas pelos
lado, perplexidade. De viradas, outras viradas, nova reversão e um final
apoteótico. Só acabou, quando terminou. 5 a 4 é mais que uma poesia de
números. É para a memória, ser lembrado com saudade.
Um belo jogo é feito disto. Extraordinário! Além dos gols, a luta, recusa de perder deixa una partida fantástica. O suor, a
lágrima tem o mesmo peso, o mesmo brilho de uma asa na chuteira. Os torcedores do Liverpool, em festa, deixando o estádio
cantando "you'll never walk alone" vale tanto quanto um título. Ou, não?
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