"Era bom estar solitário num lugarzinho, sentado, fumando e bebendo. Sempre tinha sido uma boa companhia para mim mesmo".
Eu
entendo de solidão. Mas, quem entende de Charles Bukowski é o meu amigo
Chiko Kuneski. Chiko vê o futebol pelos olhares da poesia. Sei que
também gosta de ver futebol sozinho.
Mauro Pandolfi
Há
muito tempo que não entro num estádio de futebol. Eu sou apaixonado por
futebol. É o meu culto. Mas, perdi o hábito de frequentar o 'templo'.
Tenho 'rezado' sozinho em frente da televisão. Mantenho a fé, a crença,
esperando os 'milagres'. Gosto da solidão no futebol. A 'multidão' me
incomoda. Ela faz barulho demais. Tira a atenção. Provoca ruídos. A luz
apagada, o quarto escuro, as cortinas fechadas, a porta cerrada, eu e a
bola que rola na tela da tevê. Não há silêncio. Há os narradores que
descrevem o que vejo. Uso sempre rádio e tevê. Pode ser o mesmo jogo. Às
vezes, são diferentes. Não gosto de comentaristas. Eles tem o dom de
induzir o que devo pensar sobre a partida. Estão sempre presos nos
chavões, nos mantras, nos lugares comuns tentando adaptar a 'realidade'
as suas teses. A solidão não me afasta do mundo. Exploro o mundo nas
minhas telas. Vários jogos em seguidas, na mesma hora, ou tempos depois,
num ritual que sempre se repete. A solidão do quarto revelou, mais uma
vez, a beleza, a paixão, a loucura da bola. Na quarta, o meu vício
solitário quase me provocou uma overdose. Um jogaço do 'passado', o
impossível não se tornou possível por simples acaso e o moderno deixando
a minha noite mais feliz. Eu amo futebol!
Atlético
Paranaense e Tubarão fizeram um jogo mítico. Uma volta ao passado
idealizado do futebol brasileiro. Aquele que o 'tio' mais velho conta
para os sobrinhos. "Eu estava lá...!" repete a grande história em todos
os encontros da família. Envolvente, intenso, disputado, mágico. Uma
partida de viradas, de reviradas, de acreditar sempre, de nunca
desistir. Um jogo tão bem jogado, de lindos gols. Um time pequeno que
gosta de atacar. Recusa a retranca. Usa a bola a aérea com maestria.
Waguinho Dias é um treinador para ser observado. Raro este belo Tubarão!
Os pênaltis seriam injustos neste grande jogo. Merecia um vencedor. Por
instantes, acreditei no Tubarão. Sofri com a derradeira virada. Sorri
pelo espetáculo fantástico. Não há nada que supere o futebol. O outro
nome do futebol deveria ser...vida!. E, descobri, que meus sobrinhos já
tem uma boa história para contar aos seu futuros sobrinhos.
Sempre
assisto os jogos do Jorge Wilstermann. Gosto do nome. É uma homenagem
ao primeiro aviador boliviano. O que me atrai neste time é o incomum.
Não gosta do trivial. Sempre surpreende. Ou. goleia; ou é goleado. Não
existe, em Libertadores, 0 a 0 para Jorge Wilstermann. Impossível não
existe para estes bolivianos. Superam os seus dramas, a sua condição
financeira e 'quebra' a espinha dos gigantes do continente. Não vi o
jogo. Era noite de Grêmio. Acompanhei a bolinha que avisava o gol. Na
hora dos pênaltis, a vibração, os gritos do Fabiano e seus filhos, moram
embaixo do meu apartamento, avisava das defesas de Martin Silva e a
classificação. Depois,assisti os melhores momento. Que sufoco! Faltou
pouco, muito pouco, quase nada, para mais uma façanha. Pena que não tem
mais Jorge Wilstermann nesta Libertadores.
Noite
de 'culto'. Vi um Grêmio, ainda, longe do futebol espetacular do ano
passado. Sem Arthur perde a rotação, a bola tocada com maestria, a
aproximação. Teve fúria, vontade, garra, um pouco do velho Grêmio. Do
outro lado, estava um timaço, de guris que serão páreo duro na
Libertadores. Ah, o árbitro de vídeo vai, no mínimo, diminuir a
machonaria deste lado do mundo. 120 minutos sem gols. A hora dos
pênaltis.
Baixei todo o volume da tevê.
Desliguei o rádio. O jogo já passava da meia-noite. Elaine dormia feliz.
Não
podia fazer barulho. Não gritei, não pulei, não comemorei. Só assisti.
Obedeci tanto que de manhã me perguntou como tinha sido o Grêmio. Ela,
que não torce para ninguém, abriu um leve sorriso de satisfação ao saber
do título. Ao conversar com o Mário sobre o jogo, agora à tarde, fiquei
com a sensação que perdi algo, que não aproveitei a vitória, que não
saboreei o título. A solidão provoca isto. O melhor das festa é a
companhia.