Mauro Pandolfi
"O futebol ainda mantém uma pureza. Mas, ao envolver-se em demasia, percebe-se como ele é deprimente"..
Frase
de Tim Wickery, o correspondente da BBC na América do Sul, o jornalista que mais entende o futebol neste canto do mundo.
Qual
é a função do treinador no futebol? Armar um time, descobrir
jogadores, contratá-los, inventar um jogo? Todas! E, se levar uma
comissão nos negócios é ético? Os ingleses estão discutindo isto. O
técnico Sam Allardyce, do English Team, foi apanhado numa arapuca armada
por jornalistas do Daily Telegraph que se passaram por empresários. Uma
mentira para revelar a
corrupção, o suborno, a verdade do futebol e desmascarar um pulha. Quem
foi mais canalha? O treinador ou os
jornalistas? Tudo é válido por uma boa reportagem para desvendar um
vigarista, uma fraude, que prejudique pessoas, entidades ou estados?
Qual é o limite da ética? Este é um texto com muitas dúvidas,
incertezas e poucas - ou nenhuma - verdade. Mas, o que é verdade,
mesmo?
Nenhum
treinador da Seleção Brasileira passou por isto. É mais honesto ou é
mais esperto? Esta é uma dúvida para todos os amantes do futebol daqui.
No entanto, alguns deles tem dificuldade em explicar convocações. Alguém
já esqueceu de Afonsão? Descoberta de Luxemburgo. Ou, Geferson, o
menino lateral do Inter, inventado por Dunga? Ou, Jucilei, 'craque' do
Corinthians chamado por Mano Menezes? Méritos observados pelos técnicos.
Só por eles. Nenhum vingou, Há tantos exemplos na história. Dario é um
deles. Não! Não! Aí foi uma convocação para agradar o tirano de plantão,
Médici. Zagalo é inocente nesta. Porém, ele convocou César Prates.
Inexplicável!
Forjar uma identidade. Na pele do Lobo. É uma situação do jornalista. É
ético inventar um personagem ou levar alguém a confessar algo que não
faria, a não ser iludido? É um dilema do jornalismo. É o vale tudo pela
informação, pela história ou denúncia. Goulart de Andrade se
transformava para fazer as suas matérias. A maioria inocente. Um
trapezista, um garçom, um travesti. Tim Lopes é um personagem trágico. A
identidade descoberta, a tortura, a morte. Vale a pena? Eu não gosto,
nunca fiz, nunca iludi um entrevistado ou usei um artifício para uma
reportagem. É só um pensar. O meu pensar sobre ética jornalística é
igual a ética de qualquer cidadão.
A
mentira é um sentimento que mexe com corações e mentes. Lenin
considerava válida para conquistar os objetivos. Goebbels defendia a
intensa repetição até torná-la verdade. O filósofo Kant a rejeitava
sempre. Para ele, a verdade é o maior dever moral do indivíduo e sempre
aniquila a mentira. Para salvar alguém ou a si próprio, Benjamin
Constant admirava o mentiroso. Schopenhauer vê dilemas na mentira se
causar uma injustiça. Senão, é só uma história.
O
olhar poético de Mário Quintana traz luz a
discussão. Para ele, a mentira é só uma verdade que esqueceu de
acontecer. Nunca antes na história deste país, um mentiroso, de lábia
presa, perdeu o dom da mentira. Porém, há os que se encantam com as
suas lorotas. Bom, deixa prá lá...Tenho medo dos crentes! O olhar que me
agrada é o de Pantaleão, o velho contador de história de Chico Anísio,
que ao notar o ar incrédulo do ouvinte, perguntava a
mulher: 'É mentira, Terta?' Ela respondia certeira: 'Verdade!'