segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Reflexões sem dor

quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Encanto e o desencanto do dez



"Como todos os sonhadores confundi o desencanto com a verdade!"
Não sei se concordo com Jean-Paul Sartre ao me referir a Paulo Henrique Ganso. Tenho dúvida se o meu encantamento acabou com a realidade do futebol ou a mudança do meu olhar sobre o jogo?

Mauro Pandolfi

Paulo Henrique Ganso foi o 'craque' quem mais me encantou à primeira vista. Nos primeiros lances com a bola. Nos lances sem a bola. A flutuação entre as linhas. O espaço e o tempo.  A cabeça erguida. O corpo reto. O olhar que prevê o futuro. O soberano dono jogo. O incomum! O 'dez' desenhado nas pranchetas e nas memórias de quem cultua o futebol. Um Gérson, um Didi, um Rivelino, um Jair da Rosa Pinto, um Zizinho. Nomes que conheço de ouvir falar, de leituras, de imaginários dos velhos contadores de histórias. A genialidade de Ganso comprovei quando o Santos eliminou o Grêmio na Copa do Brasil. Paulo Henrique foi soberbo. Magnífico! Um dez antigo com todo o jeito de moderno. Era 2010, ano de Copa do Mundo. Dunga rejeitou convocar Ganso e Neymar.  Inexperientes, tremeriam, disse o eterno aprendiz de treinador. Preferiu Júlio Batista, Felipe Melo e Grafite. Cada qual com as suas escolhas. O ranço contra jovens é permanente neste país. O resultado todos sabem. Sorte teve um tal de Édson que nunca teve um Dunga como técnico.
Neymar e Paulo Henrique Ganso. Aquele Santos parecia o lendário comandado por Pelé. Insinuante, hábil, bem armado, ofensivo. Os dois resgataram a glória do time 'da vila mais famosa do mundo'. Era um dueto. Um duelo. Uma dupla. Parceiros e, de certa forma, rivais. Eu achava Neymar um moleque abusado. Era disto que gostava. Ganso era cerebral demais. O pensador me chamava a atenção. Aquele Santos gerou um monte de 'craques'. Todos desapareceram longe de Neymar e Ganso. E, Paulo Henrique nunca foi o que prometia sem Neymar. Virou comum, lento, lerdo, previsível. Vive procurando o tempo perdido. Ainda dá para encontrar. Será?
Paulo Henrique Ganso foi o desencanto mais melancólico que vi. Troquei jogos do Grêmio pelo Santos para ver Ganso. Aquela genialidade foi desaparecendo, sumindo. De fã, virei um crítico ríspido, ácido, sem paciência com o jogo sonolento, antigo. Ganso tornou-se um velho camisa dez. Estático. Esperava a bola chegar ao seus pés outrora mágicos. Alguns lances ainda lembravam aquele insinuante meia. Eram escassos. Quando brilhava queriam na seleção. Ainda lembram dele! Ou pela falta de um 'dez' do sonho ou pelo encantamento platônico que resiste ao desencanto?
O futebol é um jogo de tempo e espaço. Nunca é o mesmo. Cria variáveis todo instante. Já foi 'jogo de damas' e agora é de 'xadrez'. Simples e complexo. O craque sabe interpretar o tempo e o espaço. Reiventa-se sempre. Neymar fez isto. Cristiano Ronaldo e Messi, também. Luka Modric é o exemplo de um dez moderno. Paulo Henrique Ganso parou naquele Santos. Perdeu a volúpia (talvez as cirurgias nos joelhos sejam a causa), a movimentação, a ousadia. Seu jogo ficou triste. Continua preso no seu quadrado. Ainda esperando a bola chegar em seus pés. Raramente chega. Ao chegar, o combate é imediato. Ele não entendeu o tempo. Não percebeu que a bola corre mágica. Flutua, ainda poética, mas flutua. Nestes tempos tecnológicos, feito de logarítimos, Paulo Henrique Ganso é analógico. Como o Brasil vive em sua espiral histórica, com um sombrio anos 60 no ar, os clubes apostando em medalhões decadentes, Paulo Henrique Ganso procura o futuro que perdeu em alguma esquina do campo.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Um vazio na alma!


"Eu não tenho ídolos. Tenho admiração por trabalho, dedicação e competência".
Agora, o Grêmio começa como todos os times de futebol. No gol, um goleiro. Não há mais a referência, o símbolo, a certeza, os 'milagres'. A frase de Aírton Senna é perfeita para Marcelo Grohe. Ele superou desconfianças, medalhões, torcedores e tornou-se um ídolo. Meu ídolo!

Mauro Pandolfi

'Marcelo Grohe!' A minha resposta surpreendeu o André e o Luca num sábado à tarde. Na Espn Brasil escolhiam o 'melhor Grêmio de todos os tempos'. Eurico Lara, Mazaropi, Danrlei, Leão, Vitor e Marcelo Grohe eram as opções para gol. "Achei que tu ia falar Danrlei, pai!'. Encarei os dois, ri, surpreso pela afirmação do André e expliquei. "Danrlei foi imenso. Quanto mais difícil o jogo, mais defendia. Era um torcedor em campo. Lara está no hino. Vitor, Leão, Mazaropi são bons goleiros. Marcelo Grohe é estupendo. Mais técnico que Danrlei, tão torcedor e tem uma trajetória que o torna um símbolo deste Grêmio de Renato, de Roger, que é o melhor que vi jogar. Grohe é a história em movimento. Espero que fique no Grêmio até o dia de dizer adeus à bola". Duas semanas depois, Marcelo Grohe virou saudades. Deixou o Grêmio e foi para o Al-Ittihad, da Arábia Saudita. Uma megasena, paga em três anos de contrato, é uma boa justificativa para dizer adeus antes do 'combinado'. Ficou um vazio na alma.
Marcelo Grohe viu a Batalha dos Aflitos do banco. Era só um menino de 19 anos. Conheceu o Grêmio num momento triste, de fracassos, de uma segunda divisão que parecia ser longa. Gallato ficou pouco tempo como titular. Era a hora de Marcelo. Porém, ele foi 'vítima' de um clichê, de um dogma, de uma bobagem, do futebol. O gol é para velhos. E, vieram tantos. Do argentino Saja, passando por Vítor e chegando, que pena!, no decadente Dida. Nas 'brechas' deixadas pelos medalhões, Grohe mostrava a superioridade técnica. Colocação, calma, precisão, arrojo. Mas, imprensa e torcida preferiam os medalhões.
Marcelo Grohe é uma bela autoajuda. Resiliente, perseverante, tenaz, corajoso. A sua história de ídolo - pensei em usar 'mito'. Esta virou uma palavra desgastada, mal usada, pernóstica, sem nexo - foi uma construção fantástica. A precisão nos pênaltis contra o Atlético Paranaense pela Copa do Brasil em 2016. Ali começou a fama do 'Milagrohe'. Goleiro mágico contra o Barcelona do Equador. O braço no ar, o voo certeiro, a defesa impossível, a da década, do século. Um Banks com a tricolor mais bonita do mundo. Foram tantas defesas, muitas vitórias, títulos que tem a marca de seus dedos ágeis e uma ausência injusta na Copa do Mundo de 2018. Agora, tudo é memória, saudade, história. Inesquecível!
Marcelo Grohe era a minha certeza. O gol não me preocupava. Confiava nele. Gostava da sua elegância, no seu jeito de amar o Grêmio. Vou sentir a sua ausência. Bem mais do que a saída de Arthur e Pedro Rocha. Preferia que Éverton e Luan deixassem o Grêmio. Nunca Marcelo Grohe. A escalação do Grêmio começava diferente. Grohe nunca foi um goleiro. Era um anjo, um santo, um semideus, o que me deixava tranquilo e sereno. Exagero? Certamente! Mas, como explicar para um torcedor o fascíno que me despertava? Nas conversas de futebol, de Grêmio, de chegadas e de saídas, raramente falava seu nome. Era Luan, Everton, Arthur, Geromel, tantos. Não precisava citá-lo. Parecia eterno. A vida tem os seus caminhos, escolhas, opções, Grohe pensou nos seus, na garantia financeira, no futuro. Vai se esconder na Árabia Saudita. Não na minha memória. Só pararei de sentir saudades quando surgir um outro que faça esquecer Grohe, assim como ele fez ao escolhê-lo ao invés de Danrlei para 'o melhor Grêmio de todos os tempos'..