quarta-feira, 29 de julho de 2015

O Brasil burlesco

Chiko Kuneski

Mataram nossas paixões. O verbo com sujeito indeterminado é proposital. Não foi um homicídio único, individual, culposo; foi um latrocínio coletivo. Mas o pior dos crimes, um latrocínio sem armas. Foi um roubo de almas.

Nada foi feito de rompante. Nada. Tudo com cuidado. Estudado. Meticuloso. Tudo bem ardiloso. Silenciosamente se apoderaram de nossas paixões. Surrupiaram nossos conceitos. Conceitos na calada da noite desfeitos. A eles impuseram defeitos.

E assim foram lesando o mais sagrado da alma brasileira: as suas paixões.

Com o futebol plantaram a corrupção institucionalizada que criou raízes, ramos e troncos e matou o fruto desejado. Viramos arremedos de nosso passado. Folhas caídas. Frutos podres. Ceifaram nosso sonho de sermos felizes nas conquistas dos dribles criativos, dos passes mágicos dos movimentos de “cacos” teatrais. Esquematizaram tudo. Tudo dentro do esquema.

Na política assassinaram a esperança com a impunidade de um menor infrator. Da punição não punitiva. Do latrocínio nacional sem julgamento. Mataram nossa mais íntima cresça de gritos de vencemos com um jogo de final infeliz. Esquematizaram tudo. Tudo dentro do esquema.

Dentro do esquema, esquematizaram até o dentro. Dentro de campo. Dentro dos gabinetes. O esquema tinha que matar a alegria, o desejo, o credo nos vencedores. Transformaram nossa paixão numa peça burlesca de enredo duvidoso.

O teatro de grama e paixão

Mauro Pandolfi
 
Não gosto de esporte.  Gosto de futebol. Futebol não é, mais, um esporte. É teatro de grama e paixão. A vida é representada, vivida, repartida. Tudo está lá.  O drama, a comédia, o amor, o mistério, a aventura, os enganos, os desencontros, o terror, a esperança, o sonho. Tudo contado em atos. Nem sempre bem separados. Às vezes, tudo junto. Quase nunca misturados. Atores e públicos são parceiros, ou rivais, em cena.
O primeiro ato. Vem em bandos. Trazem bandeiras, trapos, tambores e painéis com os rostos dos heróis. Os cantos são desafios bem embalados por um 'coral' afinado. De guerras ou de apoio. Dispostos a tudo. Fundamentalistas da paixão. Há o que chega sozinho. Solitário no silêncio. Aos poucos, descobre o grupo nos gritos, nas vaias, na festa. O soar do apito. Assim começa o teatro de grama e paixão.
O segundo ato. O campo, o jogo, os times.  A bola rola. Troca de passes. O jogo estudado feito um ensaio. O posicionamento lembra a marcação de uma peça. Flui em diálogos, os passes. Ou, um monólogo, o drible. O jogo vai crescendo em intensidade. Os murmúrios da plateia exige uma outra postura. A agressividade vai substituindo o riso, a diversão. Fim do segundo ato.
O terceiro ato. A pressão da vitória, o grito pelo gol, o desespero pelos erros de passes geram um drama que vai crescendo com o passar do tempo. Os olhares são de aflição. O torcedor tem o medo da derrota, do fracasso que é o seu parceiro diário. O jogo tem um segredo, um enigma. Decifra-me ou te devoro? Os enganos e os desencontros surgem na tentativa de descobrir a saída. A bola vai alta, longe, dispersa. Até que alguém descubra a magia. Decifre e crie a alegria do teatro. A plateia explode em êxtase no gol. Fim do terceiro ato.
Epílogo. O trilhar do apito. O suor, as lágrimas, os risos, os abraços, a festa, a derrota. O jogo não termina aí. O teatro de grama e paixão continua. Às vezes, como farsa. Outras, como epopeia.  Um jogo de futebol tem a duração da eternidade.

terça-feira, 21 de julho de 2015

Vendaval

Mauro Pandolfi

 Paulinho da Viola avisou que dinheiro é um pecado capital. A turma do petrolão não entendeu o samba. Foi no Moro que descobriu que é um vendaval na mão de um sonhador. Na de um canalha, é luxo, riqueza e prisão. Já Joseph Blatter sentiu que o tsunami financeiro encontrado pelo FBI nas contas da fifa faz mais estrago no futebol que um craque com o diabo no corpo. Martinho da Vila não faz sucesso com este pessoal. Afinal, mesmo que ela não dê bola, o dinheiro é sempre  dinheiro. Já eu, pobre escriba, nunca passei por isto. Também, dinheiro na minha mão, é só uma ilusão.
 Os políticos brasileiros sempre cantaram a velha marchinha de Moacir Franco. 'E, você aí? Me dá um dinheiro aí?' é o que garante a governabilidade há muito tempo neste país. Todos cantam. De vereador até presidente. Numa conta do exterior ou escondido na cueca, o dinheiro é a solução para o apoio, a campanha e as farras. Nem uma oração para o santo salva quando tudo é olhado por uma câmera indiscreta.  Acuados, berram, esperneiam, ameaçam. Mas, no fundo todos dizem a mesma coisa: 'eu mereço por tudo o que faço pelo Brasil!'. Na república das monarquias, os ex-donos do poder nunca perdem a majestade. Cair puma Fiat Elba é para amador. Um político profissional do crime é derrubado com Porsche, Lamborghini, Ferrari. Já o outro, que tem a língua presa e a fala solta, trafica palavras em troca de números. Grandes números. No mínimo com sete dígitos. Sem esquecer o vinho francês na viagem. O hino que nós - população - deveríamos cantar deveria ser o samba daquele velho cantor: 'Se gritar pega ladrão, não fica um".
 O comediante é o olhar irônico da sociedade. Tem de ser cruel com o poder. Irônico e devastador. Sem tréguas. Lembro a torta no rosto do presidente do FMI e o sapato jogado no Bush filho. É uma forma de protesto que constrange o poder. O inglês, não sei o nome, é o meu herói deste mês. Não pesquisei a identidade. O anonimato me deixa feliz e radiante. Invadiu a coletiva de Blatter e jogou dinheiro sobre ele. O presidente da fifa ficou irritado. Não sei se pela interrupção ou pelo dinheiro falso? O comediante foi retirado de cena. Aliás, atitude Monty Python puro.
Imagino a cena no Brasil. Quem faria? Pânico e CQC perderam a irreverência, a crítica com os poderosos. Adulam somente as celebridades. Danilo Gentili seria um ato pró tucano. Enquanto Jô Soares é humor a favor. Porta dos Fundos tem a anarquia necessária para isto. Marcelo Adnet não arriscaria o emprego!  Tiririca é um bom nome. Não dá! O palhaço já faz parte da turma. Ei, pessoal do stand-up, quem topa a façanha?
 Reunião da fifa. Cartolas reunidos. Nova data para a eleição. Ninguém da cbf. Del Nero foge dos aeroportos, tem medo de avião e do FBI. José Maria Marin, isolado numa cadeia suiça, entendeu os últimos versos do samba de Paulinho: "Dinheiro na mão é solução. E solidão! E solidão! E solidão!"

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Notas as notas?

Chiko Kuneski

Há nota que denota
Estardalhaça
Outra, ninguém nota
Mera trapaça.

A atirada marca
Agita
Outra, desmarca
Mera desdita.

Na atirada há a crítica
Do humor
Como bela arma

Na escondida há a mítica
Do terror

Da putrefata lama


domingo, 19 de julho de 2015

Fred tem medo da sombra

Chiko Kuneski

O futebol é disputado por pessoas, com suas idiossincrasias, seus egos, às vezes incontroláveis. Tem jogador que não gosta de perder; mas há o que pouco se importam. Perder é um dos três resultados possíveis. Existe também o jogador que não sabe perder. Esse tem o ego maior que o futebol que acha que joga.

Fred, atacante do Fluminense, é um deles. Não perde por um jogo ruim, seu ou do time, por “uma jornada infeliz”, como diziam os antigos comentaristas esportivos. Perde por nervos. Não admite um zagueiro marcador,  a sombra que anula, que o impede de jogar. Fred provoca. Irrita-se e irrita. Tenta levar para seu destempero quem o destempera.

Mesmo depois do resultado consumado pelo apito final prorroga seu jogo pessoal contra o marcador em gestos, palavras e provocações. Tenta descontar a ineficiência dos gols perdidos, dele e do time, numa prorrogação de destempero absoluto. Continua brigando com a sombra que o assombra.

Assim agiu no Maracanã no final da partida quando o Vasco venceu o Fluminense. Destemperou-se. Irritou-se. Foi provocador e grosseiro. Depois do apito final tentou brigar com o zagueiro adversário, implacável marcador e silenciador do pé artilheiro. Na saída, foi grosseiro e usou o seu sarcasmo de quem não sabe perder com o repórter esportivo, que, como ele, fazia seu trabalho e que ele procura sorridente nas vitórias. (ver vídeo).

Horas antes do jogo o Fluminense fez uma grande festa para apresentar Ronaldinho Gaúcho, sua mais nova e cara contratação. Chega para ser o novo ídolo tricolor. Fred não estava revoltado com sua incompetência de hoje de não ter marcado. Com a competência do zagueiro marcador. Nem com o repórter.


Estava nervoso e bem irritado porque corre o risco de perder seu posto de ídolo do Fluminense. Como já mostrou nos destemperos da Copa, não gosta da sombra. Fred não sabe perder. 

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Quando perder é melhor!

quarta-feira, 15 de julho de 2015

O consultor

Mauro Pandolfi

Mário Jorge Lobo Zagallo é o consultor para a modernização do futebol brasileiro. Ele foi escolhido pela cbf. Chegou o dia da primeira reunião.
- Bom dia! Vim para a reunião. Qual é a sala?
- Entra, seu Zagallo. Sala 13. Estão lhe esperando.
- Começamos bem! Quem está lá?
- O Gilmar.
- Qual Gilmar?
- O goleiro.
- Conheço muito bem!
- É aqui a reunião?
- Entra seu Zagallo. O senhor é uma glória. Seja bem-vindo!
- Quem é você?
- O Gilmar, o goleiro. Fomos parceiros de time, não lembra?
- Tu não envelhece. Qual é o segredo da fonte da juventude. Parece mais novo que o crioulo? Tem visto o Pelé?
- Não, seu Zagallo. Eu sou o Rinaldi. O senhor me confundiu com Santos Neves.
- O Gilmar que conheço é aquele. Você faz o que na cbf? Supervisor ou serve café? Aliás, não vi o doutor Havelange e nem o doutor Teixeira. Quem ligou para mim foi um tal de Del Nero. É o assessor ou quem arruma as coisas para as viagens?
- Sou o coordenador de seleções. E o Del Nero é o presidente da cbf. E, ele não quer saber de viajar.
- Quem vai participar da reunião?
- Eu, o senhor, o Parreira e outros treinadores
- O Carlinhos? Este está em todas as boquinhas.
Gilmar convida para entrar e pede um café.
- Eu tenho amor pela amarelinha. É a coisa mais importante do mundo. Todo mundo tem de engolir! Somos o país do futebol! Nós ensinamos. Nunca aprendemos.
- O senhor tem visto os jogos? Alguma novidade?
- Tudo tico-tico. Tocam a bola de um lado para o outro. Parece o América. Não ganham nada.
- O senhor acha que a Alemanha é assim?
- A Holanda é assim. Carrossel é para parque. E de qual Alemanha tu estas falando? Oriental ou Ocidental?
- O que o senhor me diz do Gérson, do Fluminense?
- Gosto muito. Pensa o jogo, é canhoto e fala muito. Cuidado! O soar dele é barulhento e pode incomodar alguns.  É um papagaio. Mas indico também o Paulo César.
- Qual Paulo César?
- O Lima do Botafogo. Dribla bem e chuta forte.
- O Caju? Não joga mais.
- Ó, coitado! Foi lesão?
- Idade! Preciso de um zagueiro rápido, enérgico. Tens um nome?.
- Chiquinho!
- Não lembro. Em que time joga?
- Botafogo.
- Não vi jogar. É bom, mesmo?
- O Pastor é um guerreiro, sua a camisa, o que vai alegrar muitos, e é  melhor que o Brito.  A imprensa não gosta dele. Mas eles não entendem nada de futebol. Enchem o saco com Dirceu Lopes e Ademir da Guia. Dois meias superados. Bons são o Dirceu e o Rodrigues Neto.
- E, o Marinho, que o Cruzeiro contratou, o senhor gosta?
- É abusado. Apoia muito. Tive que criar um esquema com o Dirceu. Leva os dois.
- Dirceu? Já sei quem é. O Ganso lhe agrada?
- Não lembro dele. Gosto é do Pintinho. E o Dario? O presidente não pediu?
- Pedir todo mundo pede. Às vezes, atendemos. Sabe como é....
- Tem um volante novo do Inter que o Carbone falou.
- Dourado?
- Não! Tem nome de pássaro. Acho que é Águia.
- Falcão! Daqui a pouco ele chega para a reunião. Agora, é treinador.
- Bem que me disseram que iam renovar tudo. Mas, um juvenil ser técnico é um exagero, não acha?
- Ele tem quase 60!
- Então era gato. Bem que o Carbone me disse que os gaúchos achavam ele um gato. Por falar em gato, o Leão vai continuar no gol?
- Ele, também, vem para a reunião. Não é mais goleiro. Está em casa descansando.
- Acho que também vou para casa descansar. Mas vou dar uma sugestão: convoquem o Ferreti!
- Ferreti? Quem é?
- Não conhece! O jogo está difícil, apertado, complicado. Chamo grandalhão e o Paulo César mete a bola na cabeça dele. É gol! Depois, fecho time. É o meu talismã. Nunca falha.
-Vou pensar!
- Querem renovar com quem não conhece nada! Avisa ao doutor Havelange que estou a disposição. Afinal, 'Zagallo é o novo' tem treze letras e sou pé quente. Dá um abraço no Carlinhos. Tchau!

terça-feira, 14 de julho de 2015

CPI do Futebol

Para mexer; e deixar como está

Chiko Kuneski

O povo brasileiro pede por honestidade. Pelo fim das corrupções. Por punições dos corruptos. Por Cidadania. No futebol não é diferente. O torcedor quer transparência. Quer dirigentes honestos. Ainda acredita que é possível mudar o futebol brasileiro, como acredita que é viável mudar o país.

O torcedor é um apaixonado. Pelo time, pela seleção, acima de tudo, pelo Futebol. As paixões são cegas, irracionais e sem sentido lógico. A logicidade macabra fica por conta do pragmatismo dos políticos e dirigentes futebolísticos.

O Senado aprovou a CPI do Futebol, que tem como presidente o ex-jogador e  atual senador pelo RJ Romário, mas o relator é Romero. Romário será uma marionete. Um fantoche. Romero Jucá escreverá o relatório final. Porá um ponto final. O Senador já foi ministro de Lula da Previdência Social, quando respondeu por corrupção. Líder dos presidentes Lula e Dilma no Senado. Precisa dizer algo mais?

Nesse tempo todo de liderança nunca protocolou uma petição parlamentar para apurar os desvios bilionários da CBF e da FIFA, com impostos dos brasileiros, para a Copa das Copas e seus “elefantes brancos”. Jucá é um zumbi do parlamento, que suga qualquer tentativa nova de mudança. Sua escolha é perfeita para a corrupção pragmática. Investigar para não apurar. Mexer para deixar como está.

Mas a bagunça parlamentar vai além. Fernando Collor será um dos integrantes da comissão. Um estelionato político, que roubou toda uma Nação no seu bem mais íntimo: a poupança. Nunca pagou. Está novamente sendo alvo de corrupção.  A Polícia Federal já não leva mais Fiat Elba da Casa da Dinda; dirige Ferrai, Porsche e Lamborghini. Mas Collor vai investigar a corrupção do futebol.

Criaram mais uma CPI do Senado para fazer uma cortina de fumaça, escondendo a corrupção na pirotecnia parlamentar. Mais uma vez escolhem as peças chave para mexer e deixar como está

segunda-feira, 13 de julho de 2015

É possível filosofar em português


                        Mauro Pandolfi

Daniel Alves é um homem moderno. Tem o mosaico da sua vida perpetuado no corpo. A luta, a derrota, a vitória, a sua historia são desenhos que marcam, também, a alma. Estiloso. Sabe combinar um terno azul claro com um tênis vermelho. Em alguns, beira o ridículo. Nele, é pura sofisticação. Troca de óculos com a mesma facilidade de um passe de Iniesta.
O olhar frio de 'pistoleiro', que é decifrado por uma câmera de televisão na hora da cobrança de uma falta, é o mesmo que se emociona ao falar com a torcida culé. Daniel aprendeu a jogar sem bola, procurar o espaço vazio do campo e o vazio que o jornalismo esportivo não ocupa. No programa Bola da Vez, da Espn Brasil, ele revelou ser um 'pensador' ousado, crítico, devastador sobre o futebol brasileiro. Uma entrevista fantástica. Uma lição sobre o futebol e a vida. Imperdível!
Não é só o Oceano Atlântico que separa Barcelona do Rio de Janeiro. É um túnel do tempo. Pelo menos, no futebol. Segundo Daniel Alves é uma volta ao passado. "Só as cinco estrelas não ganham mais nada. Não estamos nos reinventando. Aqui ainda há titulares e reservas. Não entenderam que o time que entra em campo é escolhido pelo esquema tático da equipe e do adversário. São os mesmos métodos, treinos. Falta estrutura, gestão, preparação. Se os treinadores brasileiros fossem mesmos bons estariam nas grandes ligas", explica.
A metralhadora giratória - 'sou mesmo linguarudo',  -  é devastadora. Arrasa com a comissão técnico da  seleção. Para ele, a goleada alemã era previsível: "taticamente não estávamos preparados. Futebol não tem surpresa, futebol é preparação, vitória é preparação". O time dos treinos foi um. Quem jogou foi outro.
Pep Guardiola é um sonho para quem ama o futebol. Eu o queria no meu time. Ele se ofereceu para treinar a seleção. Foi recusado. "Pep é o melhor treinador do mundo. Revolucionou o futebol, um time, você tem a chance de ter o cara aqui, sem ter que gastar, você deixa passar uma oportunidade desta, não pensa na seleção", afirmou. Um destes que não pensa na seleção é Carlos Alberto Parreira.
O soberbo tecnocrata, campeão mundial por estes desígnios inexplicáveis dos deuses da bola, afirmou que "para ser treinador tem de ganhar três brasileiros e três copas do Brasil". Mentira! Parreira sabe que o futebol é o microcosmo do país. O técnico é escolhido da mesma maneira que se escolhe um ministro, um chefe de autarquia ou presidente de estatal. É uma relação de compadrio, de interesses ou para atender a companheirada. Será que currículo, mérito e títulos não são fundamentais? Ou é um devaneio 'coxinha'
De Juazeiro até Barcelona. Da roça aos títulos. Daniel Alves mostrou que é possível filosofar em português. No ano passado, no mesmo Bola da Vez, Paul Breitner foi magnífico na conversa sobre futebol, história, comportamento. O papo com Daniel Alves é complementar. A última resposta é uma lição de vida. Qual foi? Assista o programa.

sábado, 11 de julho de 2015

Entre o suor o som

Chiko Kuneski

Numa aparição inusitada no programa “Altas Horas” Neymar Jr saiu-se com essa pérola:

Ninguém sabe o que a gente ‘soa’ (sic) quando a gente defende a Seleção.

Neymar Jr tem razão. Ninguém, sabe, não vê;  apenas imagina esse soar. Que está no imaginário dos torcedores e faz tempo não acontece.

Uma coisa é soar nos microfones midiáticos. Outra é suar a camisa em busca de conquistas nacionais. Nem mesmo quando a mídia, obrigada pelos patrocinadores da corrupção do futebol, tenta alavancar o “craque de Playstation” ele se mostra diferenciado.

Escorrega no português fácil. Erra, de propósito; ou por ignorância juvenil, o básico da língua.


Alguém tem que dizer para Neymar Jr que o país não precisa de mais aviltador da língua portuguesa para ser o novo “salvador da pátria”. Um exemplo negativo está se mostrando mais que suficiente.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Crônica poética

Chiko Kuneski


O 1 a 7 alemão
Não foi apagão
Como fala o Felipão
Foi mais o 171
Oficial para a Nação

O perdedor

Mauro Pandolfi

“Mal acabava uma luta... e começava outra. E quando eu dava por mim, estava no meio de outra peleia. Não conseguia parar. E lá vinha outra guerra, e outra guerra, e outra guerra, e mais outra guerra, eu guerreei todas as guerras! Não perdi nenhuma!”
   Um certo capitão Rodrigo Cambará em O tempo e o vento.
 Olhar vago. Longe, distante. Os passos são lentos. A pequena passarela parece um longo caminho para o patíbulo. Para. Abaixa a cabeça.  Recebe uma medalha. Lembra mais uma guilhotina o decepando. Dá dois passos e guarda o troféu no bolso. A expressão é de um derrotado.  Lionel Messi repetiu a cena nos últimos dois anos. Que estranho mistério é o futebol. Na troca de camisa, de parceiros, de alma, o genial se transforma em pouco mais que um craque. O que ocorre? Há dois Messis? Ou o futebol é só uma caixinha de surpresas?
 O futebol é jogado em quatro linhas. Os jogadores são dispostos em funções táticas. O campo é ocupado. A luta é árdua, envolvente e perigosa. Vence quem melhor lê as entrelinhas do jogo. É como se fosse um segredo. Messi é quem decifra melhor os enigmas. É o grande leitor do jogo. Anda por linhas não imaginadas.  Descobre atalhos escondidos. Torna o difícil simples. Messi é o futebol total. Brilha intensamente no Barcelona. 
 Com a camisa da Argentina vira só um craque. Um jogador fabuloso enredado por 'craques' comuns e treinadores pouco mais do que medíocres. Seu jogo não flui. Falta a inteligência de raciocínio de Iniesta e Xavi. Recente da velocidade intuitiva de Neymar e da volúpia do gol de Suarez. O fantástico precisa de parceiros para ser fantástico. Isolado é pouco menos que um gênio.
 Os argentinos não gostam de Messi. O toleram nas vitórias.  A imprensa o considera culpado pelas derrotas nas finais. Há um massacre verbal.  Se naquele contra-ataque mortal no final da partida contra o Chile, o tosco Higuain marcasse o gol. O que diria a imprensa sobre Messi? Manteria as críticas ou reconheceria o gênio?  A dúvida do 'se' é um dilema filosófico do futebol. Sei que preferem Tevez. É uma escolha!
 Tenho dois amigos portenhos que pensam assim. Alberto, torcedor do River, considera Di Stefano e Sivori superiores a Maradona, é um crítico feroz de Messi. Para ele, Lionel é espanhol. "Não é argentino. Foi criado na Espanha e não tem a nossa alma. É um estranho com a camisa azul celeste", afirma. Já para Abel falta carisma. "Se este rapaz não tivesse talento para o futebol, teria muita pena dele. Olha a cara, as expressões, os olhares. Parece um repositor de supermercado", explicou. Quando for ao supermercado vou conversar com os repositores. Saber quem joga bola. Talvez, se Abel tiver razão, encontro um Messi para o meu Grêmio.
 A frase de Rodrigo Cambará é um bom retrato de Messi. Ele não foge da luta. Não se esconde atrás de uma lesão ou cansaço. Vai à guerra. Chama o jogo, se expõe. Erra e acerta. É do jogo. Messi já entendeu que o tempo e o vento moldam o caráter, a têmpera e a virtude. Talvez, não ganhe nenhuma copa do mundo. Tem bons companheiros nesta falta. Zico, Falcão, Careca, Cantona, Sócrates, Sivori, Platini, Puskas, Cruyff não estão entre os ganhadores. Que timaço, hein? Lúcio, Roque Jr, Gilberto Silva, Paulo Sérgio, Materazzi, Larrosa, Graziani, Luque, Briegel ergueram o troféu. Que ' esquadrão', hein? A vida é uma escolha. Quem você prefere? Eu fico com a turma do Messi.

Para sempre

 O 7 a 1 da Alemanha nunca terminará. Até o último momento da eternidade estarão em campo. Ontem, na Câmara dos Deputados, os alemães marcaram mais gols. A bancada da bola conseguiu modificar vários itens da MP do futebol. Diminuíram as contrapartidas dos clubes e aumentaram o prazo para o pagamento das dividas.  Ampliaram o colégio eleitoral da cbf.
  Pouco. Muito pouco. Nada. Era o momento de radicalizar, modernizar, transformar o futebol brasileiro.  E, isto passa pelo extermínio das estruturas, da cbf e das federações.  Mas, no Brasil as mudanças são teóricas. Muda não mudando. Tudo permanece como está.  Não há política para nada. Há programas, alguns bons, e muita mistificação.  Não altera-se a estrutura, o pensar. Esperamos eternamente um salvador. E assim vamos vivendo...

terça-feira, 7 de julho de 2015

O herói se forja na chama

Chiko Kuneski

Numa postagem atrás, quando foi expulso contra a Colômbia depois do jogo encerrado pela Copa América por pura birra de “menino mimado”, chamei Neymar Jr de craque de Playstation. Confesso agora. Enganei-me. Neymar Jr é um ser humano virtual.

Perdeu completamente sua conexão com a realidade e age apenas como mito midiático. O vídeo postado na internet numa festa de novos ricos mimados mostra um arremedo de herói, que não entende as responsabilidades que esse substantivo representa. Muitos dirão que estou sendo exagerado e que o “craque” está de férias e tem direito a sua vida particular e sua individualidade. Ídolos não têm direito a individualidade. São coletivos. São, acima de tudo, exemplos, para o melhor ou para o pior, dependendo de suas posturas.

O craque do Barça passa longe de ser um diferenciado na Seleção Brasileira. A esnoba. A subjuga. A despreza a ponto de provocar uma expulsão infantil para entrar de férias. Desligou-se do elenco porque não é um líder real; é uma fantasia criada, uma necessidade inventada por patrocinadores e jornalistas esportivos “bobos da corte”.

Esses são os jornalistas que divulgam os números do “craque de Playstation” como feitos de um ídolo de carne e osso. Talvez, e isso é bem provável, o jogador bata todos os recordes e números positivos do futebol nacional. Talento tem.

Mas esqueceram de alertá-lo que os números ficam nas memórias apenas dos compêndios e dos analistas esportivos. Na dos torcedores gravam-se os exemplos das grandes conquistas capitaneadas pelos que elegem como craques e ídolos. Se continuar a ser um “ser humano virtual” Neymar Jr corre o risco de ser no futuro um Jobson real.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Os deuses vencidos

 Mauro Pandolfi

"O lado ruim da vitória é que ela não é definitiva. O lado bom da derrota é que ela, também, não é definitiva"
                                                 José Saramago

Drama. 200 mil pessoas andam sem rumo. Olhares atônitos encontram o vazio no horizonte. Lágrimas escapam. A multidão não reage. A história é recontada. Cada um tem a sua versão. Todas diferentes. Nenhuma é igual a outra. O silencio é ruidoso. Dá para ouvir os gritos do pequeno grupo de homens que calou o gigante de cimento. Estão trancados no vestiário. 16 de julho de 1950 é a 'tragédia' brasileira. Tão dramática como as gregas. Ninguém morreu. Todos foram abatidos. As almas brasileiras foram despedaçadas. Os onze do campo de jogo foram devorados. Alguns por inteiro. Outros junto com o futebol em partes, lentamente. Gente que perdeu o jogo, a identidade, o espírito. Para sempre vira-latas. Vagaram o resto da vida feito um zumbi. Barbosa foi um deles.

A derrota de 50 é a maior do futebol brasileiro. A mais dramática, devastadora. Atingiu o orgulho. O Brasil grande é ferido. Nada muda no processo desenvolvimentista. A modernidade era a ambição de Vargas que seria eleito em outubro. A televisão é instalada em São Paulo. A alma brasileira é reconstruída aos pedaços, junto com o futebol. Um menino no interior de São Paulo, que escutou a derrota pelo rádio, prometeu ao pai que será campeão do mundo. Cumpriu três vezes. O seu nome é Edson. O futebol é de Pelé.

2014. Julho. Oito. A segunda grande derrota. Os alemães passearam, brincaram, aniquilaram a frágil seleção brasileira. Os gols foram pura magia. A arte tão sonhada do futebol tem um sotaque germânico. Não foi uma 'tragédia', nem dramática. Foi mais farsesca. Virou zoeira na internet, nas ruas, nos programas de humor. A destruição de uma mitologia que já era ruína. O país explodia em escândalos e pedia uma grande transformação. Nada mudou. Os escândalos continuaram e Dunga foi o escolhido para a seleção. Será que algum menino triste com a tristeza do pai prometeu o mesmo que o Édson? Tomara! Esta é a esperança. Mudança no futebol e no país? Aqui, as coisas mudam para ficar como estão!
 
 Messi foi o carrasco da terceira maior derrota do futebol brasileiro. Numa noite fria de terça-feira, o genial Lionel foi destruidor. Rápido, mortal, certeiro. Seus companheiros de massacre foram Pastore e Di Maria. O Brasil jogou de vermelho e branco e usou o nome de ...Paraguai! Está foi a grande derrota virtual. Uma goleada que começou assim: 'de que escapamos!' e terminou num 'obrigado Paraguai pelos pênaltis!'. Era o resultado sonhado, pedido, desejado, autofágico. Voltamos, como farsa, ao julho de 1950. O complexo de vira-latas retornou. Mais forte, mais dramático, mais cínico. Acho que desta vez nenhum menino prometeu nada ao seu pai.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Gols, mentiras e videoteipe

Mauro Pandolfi

"A mentira é uma verdade que não aconteceu"
Mário Quintana

Domingo de manhã. Lá por 98. Faz muito tempo, eu sei! Busquei na tevê um joguinho de futebol. Achei um torneio de seniores na TVE do Rio. "Cariocas x Paulistas. Encontro de craques". Era assim a chamada do jogo. Levei um susto quando narrador anunciou 'Luís Fernando, o craque da democracia corinthiana'. Para completar, o comentarista chamou Delacir de 'um virtuose do meio-campo'. Dois bondes no auge da carreira. Gremistas, flamenguistas e corinthianos sofreram com estes 'craques'. Entre perplexo e pensativo passei a desconfiar das verdades do futebol, dos seus mitos, dos deuses, dos heróis, dos textos. Entendi que é um jogo de mistificações, trapaças e mitologias.

Tostão é um artesão. Produziu joias como ponta de lança. Como colunista de futebol é um arguto observador. Olha por dentro e percebe de fora. Na coluna de 23 de maio de 2015, na Folha de São Paulo, dissecou o 'mito' Vanderlei Luxemburgo. Revelou que ele é apenas 'um reflexo no espelho'. Alguém que acreditou quando o chamaram de 'mago estrategista'. Para Tostão, Luxemburgo, e outros supertécnicos, não perceberam a transformação do futebol. Repetem os erros, os treinamentos, a observação, as soluções.

Continuam com os sistemas de 20 ou 30 anos atrás. Um futebol de pegada, marcação com três volantes - um cabeça de área e dois de lado, cobrindo o avanço dos laterais - e um meia para aproximar com o ataque. O jogo truncado, com bola aérea, chutões e muita correria. Mantém a setorização, a separação das linhas e um jogo longo e previsível. Tostão culpa os treinadores pelo fim dos armadores.

O ex-centroavante do Figueirense, Barbosa, amplia a crítica de Tostão. "O problema é a falta de treinamento. Os técnicos não corrigem e não ensinam os jogadores. Os fundamentos são precários. Observe os erros de passes, posicionamentos, chutes e dribles. Poucos acertam. Os treinadores não trabalham a correção. Há só coletivos e poucos táticos. Quase nenhum técnico", afirmou.

Quem sou eu para contestar Tostão e Barbosa. Mas, vamos lá! Sempre foi assim. O futebol brasileiro é uma ilusão, um devaneio, uma ficção, uma romantização de estilo. Poucas equipes foram diferentes. Esquadrões que conta-se nos dedos. Reparem quantos times de qualidade teve seu clube na história? Três ou quatro. O restante eram medianos. Isto é em qualquer clube do Brasil.

O futebol genial é aleatório. Não sei como se produz. No entanto, de tempos em tempos, surgem jogadores fantásticos, criam equipes espetaculares, partidas mágicas. Tornam-se referências históricas. Passam a impressão de que sempre foi assim. No entanto, infelizmente, é um engano. É apenas um hiato de qualidade.

'Realidade' foi uma revista revolucionária dos anos 60. Pegou a ditadura distraída e produziu grandes reportagens. Tenho uma delas guardada em um canto da casa da minha mãe. Usei no meu trabalho de conclusão de curso em jornalismo. Era sobre o futebol brasileiro. 'A decadência. O fim dos craques. Os grandes ídolos já não eram os melhores e os novatos não passavam de promessas'. O ano da revista? 1968! A matéria temia pela não classificação para a Copa do Mundo de 1970. Todos sabem o que aconteceu dois anos depois. E, aqueles campeões nunca mais repetiram a performance do México. Ah, ficar fora da Copa do Mundo parece um desejo. Falaram isto, além de 68, em 77, 85, 89, 93 e 2001. A esperança se renova agora.

Bill James desmontou as 'verdades eternas' do beisebol. Em Baseball Abstracts, reinventou as analises do jogo. Estudou as estatísticas históricas e descobriu que "uma grande parcela do conhecimento tradicional do esporte é baboseira ridícula". James estudou o beisebol com "o mesmo rigor e disciplina intelectual normalmente aplicados por cientistas renomados e desconhecidos, na tentativa de solucionar os mistérios do Universo, da sociedade, da mente humana ou do preço de sacos de estopas". Vários consultores de clubes passaram a adotar as analises de Bill James. Os mitos foram demolidos. Sobraram as lendas. Mas, somente como lendas.

Um estudo equivalente a este no futebol brasileiro produziria o mesmo estrago. Fim de mitologias, de craques e de equipes. Vamos descobrir que somos defensivos. Ganhamos cinco copas com ótimas defesas. O futebol sonhado dos anos 50, 60 e 70 é uma fantasia. Invenção de cronistas, de narradores e produto de uma história oral fascinante. A imprensa esportiva ainda acredita nisto. Vivem suspirando por um dez que nunca existiu - ou, já terminou - e desesperam-se por um centroavante arcaico, de 'referência'.

Um destes jogadores comentarista daqui, depois do jogo Avaí x Grêmio, reclamou a ausência de Douglas na Seleção de Dunga. Douglas? A estéril habilidade que se perde na indolência e nas firulas. Um vetusto meia perdido no tempo e no espaço do futebol. Um criador de lances pictóricos inúteis. Este é o padrão da análise da imprensa esportiva no Brasil que não distingue um drible vertical de um mero malabarismo estético. A revolução no futebol tem de ser total. No campo, na gestão, na análise. Abandonar conceitos obsoletos, chavões, o 'achismo', o clubismo e a linguagem.

O futebol era 'tão ofensivo' que em 1975, a CBD criou um ponto extra para vencedores por uma diferença de dois gols. Os placares mais comuns nesta década eram o 1 a 0 e o 0 x 0. A média de gols mais baixa no campeonato brasileiro é de 1971: 1,83 por partida. E, ainda havia Pelé, Tostão, Jairzinho, Dario, Rivelino etc. O campeonato brasileiro chegou a ter 92 clubes. Esquadrões como o Ceub de Brasília, Tiradentes do Piauí e Saad de São Caetano. Times que só loucos por futebol e videoteipe lembram. Porém, como dizem por aí, quando a lenda é mais interessante que a verdade, permanece a lenda. No futebol brasileiro ainda é assim.

Nunca se jogou tão bom futebol como hoje. Há todas as valências em ação. Vontade, habilidade, técnica, física, tática e poder mental. Os principais campeonatos europeus são assim. No Brasil, é outra história. Somos o que sempre jogamos. Não há os candidatos a mitos. Os jogadores vão embora ainda garotos. Sobram os medianos. Assistimos os clássicos europeus. Queremos, desejamos, torcemos para sermos iguais. Estamos longe, distante, como sempre tivemos destes jogos. Não há como comparar.

No passado um time era formado em dois ou três anos. Isto criava uma equipe sólida. Produzia a ilusão de grandes craques. Jogadores medianos pareciam melhores do que eram. A mecânica da equipe criava esta magia. Hoje, a cada três ou quatro meses, muda-se tudo ou quase tudo. Os times são formados por veteranos decadentes, comuns e promessas, que muitas vezes, ficam só na promessa.


O futebol não é feito só de gols. Além dos dribles e passes, há uma história intensa que move uma cidade, um estado, um país, o mundo. Um jogo em que tudo pode acontecer. O craque vira bonde. O bonde torna-se gênio. A derrota transforma-se em vitória. A vitória desmancha-se em um lance fortuito, acidental, mágico. O futebol é uma farsa. Uma deliciosa mentira que de tanto ser contada, torna-se verdade. Mas, o que é mentira? A verdade do jogo foi tão esquecida que parece mentira. Porém, o que é verdade?