domingo, 29 de março de 2015

O drible derradeiro

Chiko Kuneski

- Expulso?  Eu? Mas o que eu fiz?
- Nada!!
- Então porque estou sendo tirado de campo?
- Já mandei! Fora! Sai por bem ou chamo os policiais.
- Se é assim...
Um longo respirar de resignação, olhar triste para o gramado, cabeça baixa.
- ... eu saio, senhor juiz.

Caminhou em passos lentos, lamentoso. Não iria participar dos minutos finais e cruciais daquela partida tão importante. Nem xingou em pensamento o árbitro, ele não merecia sequer seu desprezo. Não olhou para trás. Apenas caminhou calmo, respirando ofegante, encharcado pela torrencial chuva de final de verão que não parava de cair.

As lágrimas na face não eram de tristeza, de raiva, de revolta. Soluçava pelo inédito momento. E tinha que ser logo naquele fatídico dia. Mas a chuva adoçou o amargor da expulsão. A chuva e a quase incontida euforia, já misturada com a precoce saudade.

Aquela partida seria sua última. Depois de tantas, sempre no mesmo campo. Sempre por seu time do coração eleito ainda criança. E, logo nesse jogo, sua única exclusão de campo e por não ter feito nada.

Antes de deixar o gramado teve a petulância de parar, virar o corpo, olhar altivo e ouvir o estrilo do apito. O jogo acabou. Acariciou com carinho a bola que surrupiou sem que ninguém visse e vibrou. Vibrou como nunca antes na vida.


Aquele era o primeiro campeonato do time que tanto amava e por quem dedicou tantos anos a cada domingo. Embalou a bola com o manto sagrado do time do coração, ainda do menino, que secretamente vestia sob o uniforme já surrado de gandula.

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