Mauro Pandolfi
Saiu o segundo gol do Brasil contra a Alemanha. E foi de Dilma
Roussef.
Poxa! Quem diria! A presidente encurralada, driblou por instantes
o cerco, e assinou uma medida provisória que poderá mudar o futebol brasileiro.
Os clubes terão vantagens no pagamento de dívidas com a União e o fisco. As
contrapartidas, se forem cumpridas, é que modificarão a história.
Acabarão os donos do poder, as capitanias e os feudos. Os coronéis e os
caudilhos sairão de cena. Sairão mesmo? Delfim de Pádua Peixoto será só um
retrato na parede. E, não haverá saudades.
Lamento que a medida não seja radical e extermine a cbf e as
federações. Há uma brecha para a criação de ligas. Dependerá dos clubes. Chegou
o momento do futebol profissional sair do campo e invadir os castelos dos
cartolas. A partida nem começou. Os adversários são caneludos, traiçoeiros,
'picaretas' e 'achacadores'.
O futebol brasileiro vive de fases. Começou no social, na
urbanização das cidades. Os bairros surgiram ao redor do campo de jogo. Os
moradores inventaram clubes. Aqui surgem os grandes. Campeonatos citadinos
foram disputados e os jogadores eram do bairro, amigos. O amadorismo foi
substituído por um profissionalismo chamado de 'marrom', isto é, pagamento por
fora.
O rádio começa se interessar pelos jogos. Eles são transmitidos e
tornam-se um vício que nunca terminou. Jornais esportivos são criados e
ingressos passam a ser cobrados. Políticos percebem o alcance do esporte. É o
tempo de 'governar é construir estradas'. O futebol vira estadual. Há
importação de jogadores, profissionalismo de fato, outra leva de extinção dos
clubes. Surgem as federações e os políticos transformam-se em cartolas. É
a segunda fase.
A globalização, dos anos 90 e a deste século, provoca a terceira
fase e a quarta: a nacionalização e a internacionalização do futebol. Uma nova
onda de extinção voltará aos clubes brasileiros. A terceira fase e quarta fase
são a econômica e a financeira. A medida provisória provocará a entrada do
futebol como componente de atividade econômica, com regulação, leis, multas,
lucros, empregos. Basta o congresso aprovar a medida e a lei ser aplicada.
Porém ..., como fala um célebre filósofo local: "diz pro
bonequinho". A medida provisória foi uma promessa de Dilma ao Bom Senso.
Neste caso, em quase todos, promessa é dúvida.
De boas intenções, o congresso está cheio. O inferno, também!
Dilma está sitiada. O apoio no congresso é um balcão de negócios. Tomara que a
medida provisória não se torne instrumento de barganha. Há uma grande chance de
ocorrer esta negociata. A esperança, todos sabem, é a última que morre. No
Brasil ela é sempre trucidada.
Petistas e tucanos andam de mãos dadas na bancada da bola. São
unidos, fortes e contam com apoio da cbf, das federações e dirigentes de
clubes. O deputado Vicente Cândido (PT|SP) é o principal articulador da
bancada. É o vice da federação paulista e sócio de Marco Polo del Nero,
presidente eleito da cbf. Otávio Leite (PSDB|RJ) e o ex-presidente do
Corinthians, Andrés Sanches (PT|SP), íntimo de Lula, são empecilhos para
aprovação. Além dos parlamentares, dos cartolas das federações e dos clubes, há
jornalistas esportivos contrários a transformação do futebol brasileiro. Eles
vivem, e enriquecem, com as maracutaias da bola. No momento da discussão e da
votação é a vez de um panelaço. Sei que é difícil pedir para bater as panelas
em favor de algo neste país que tenha as digitais de Dilma Roussef. Mas,
já separei uma frigideira.
Mandato curto para os dirigentes, responsabilidade fiscal - mais
rígido que o futebol europeu -, proibição de antecipação de receitas da tevê,
auditorias anuais, pagamentos das dívidas em longas parcelas, investimento na
base e no futebol feminino e rebaixamento por não cumprimento do acordo ou
atraso salarial aos jogadores são as bases da medida provisória. Faltaram
itens fundamentais. Um deles é um calendário para todos os clubes pequenos que
jogam três ou quatro meses por ano.
Sonho? Esperança? Certeza? Nunca antes na história deste país
houve uma oportunidade de revolução do futebol como esta. Nos últimos
doze anos todas as reformas cruciais e as transformações foram
ignoradas em troca de uma grande mistificação social e política. Se o PT
de Lula, o PSDB de FHC, o PMDB de Cunha não atrapalharem a aprovação, ou
exigirem uma doação legal, o Brasil entrará no século 21.
Pena que só no futebol está ocorrendo a passagem para o futuro. A
educação, a saúde, o pensar político, econômico continuam presos no passado que
nunca passa.
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