terça-feira, 31 de maio de 2016

Esquecidos



Mauro Pandolfi

O futebol é a mitologia moderna. Há os deuses, os semideuses e os heróis. O supremo ser é Pele. Na sua órbita giram inúmeros titãs. O mais próximo é Messi. Há uma gritaria que escuto ao fazer esta observação. Não me incomoda mais. Na sua escala vertical, a mitologia tem espaço para todos. Desde os eternos até os grandes nomes momentâneos. Gênios de um jogo, de uma temporada, de jogadas únicas. Tem, também, lugares para aqueles que o tempo abandonou. Extraordinários craques que poucos, ou ninguém, lembra. Tantos estão no limbo, navegando como 'esquecidos'. Vou lembrar de dois. Roberto Dias (São Paulo) e  Marinho Chagas, (Botafogo, Fluminense, etc). Poderia citar Iúra (Grêmio),  Éverton (São Paulo e Atlético Mineiro) e Pita (Santos e São Paulo). Estão tão esquecidos que é necessário citar os clubes que jogaram para as pessoas 'refrescarem ' a memória.
O zagueiro arrepia. Joga bola para o mato. Afinal, é jogo de campeonato. Limpa a área. Não sai jogando. O chutão é o seu jogo. Alguns são sentimentais, sutis. Raros são elegantes. Rápidos, enérgicos. Não gosto dos zagueiros de hoje. Busco na memória o melhor da minha infância. Roberto Dias. Tão hábil, sutil e elegante. Gostava do chapéu. Até Pelé levou o drible. Dias era um estilista. Um anjo e o dono da área.
Dias tinha a precisão de um meia. Raramente errava um passe. Chutão? Amava a bola. Não conseguia tratá-la mal. Espetacular! Os gols do São Paulo, na temporada de 67, começavam por ele. Inteligente e tático.  Ficou fora da Copa de 66. Preferiram os medalhões Bellini e Orlando e a força bruta de Brito. E, o Brasil não passou da primeira fase. Parou por dois anos. Problemas cardíacos. Jogou até 1978 no minúsculo Nacional de São Paulo. Roberto Dias Branco faleceu, de infarto,  em 2007. Foi menos do que deveria ter sido. Um craque para o futebol de hoje.
Marinho Chagas era como o vento. Liberdade, liberdade. Era o seu mote, seu signo, seu desígnio. Flutuava pelo campo. Desfilava a bela cabeleira loira rumo ataque. Ele destruiu a barreira da defesa para o lateral. Preferia atacar. Chute poderoso. Ambidestro. O drible sempre por dentro. Ás vezes, cortava para fora. Iludia o marcador. Marinho Cagas foi o meu ídolo nos tempos de Vermelhão. Junto com Parraga, é claro!
Há uma lenda sobre  a habilidade de Marinho. Dizem, que numa festa, pediu para Chico Buarque cantar. Chico riu, disse que cantava se Marinho fizesse dez embaixadinhas com uma laranja. Marinho sorriu. Trouxeram a laranja. Marinho fez 200 e entregou, com o pé, a laranja na mão de Chico. Construção foi a música que cantou. É uma lenda! Fantástica! O mais moderno jogador de seu tempo.
Marinho peregrinou nos campos do mundo. Foi o melhor lateral da Copa de 74. Do Fluminense foi para os Estados Unidos. Na volta para o São Paulo, não era mais o lateral  inovador. O tempo mostrava as garras. Marinho fez o caminhos dos medalhões decadentes. Jogou em times pequenos até parar em 88 no Augsburg da Alemanha. Francisco das Chagas Marinho morreu em 1º de junho de 2014, de hemorragia digestiva alta. O futebol tem saudade de Marinho Chagas. Não vejo ninguém jogar como o vento.
São dois nomes. Dois ídolos. Fazem parte da minha memória de futebol. Talvez, eu exagere na análise, na qualidade do jogo, na descrição do talento. São olhares de um menino. O adulto não quer destruí-lo. Quer reverenciá-lo!


Nenhum comentário:

Postar um comentário