Mauro Pandolfi
"Minha pátria é minha infância: por isto vivo no exílio".
O verso de Cacaso me anistiou para chorar por Alcindo.
Domingo triste. O menino de Lages, que aprendeu amar o futebol no Vermelhão, chorou com a morte do centroavante que o transformou em gremista. O velho, que nunca perdeu o amor da bola, ficou emocionado. Melancólico todo o dia. As lágrimas escaparam no minuto de silêncio na Arena. O empate contra o Galo não significou nada. Foi o dia de lembrar de Alcindo Martha de Freitas. O Bugre que demolia defesas, o maior goleador nos grenais e o último parceiro de Pelé. Aos 71 anos, de diabetes, Alcindo deixou a vida. Agora, vive como lenda.
Foi lá por 67. No Vermelhão que descobri o Grêmio. Fui ver o treino do time que enfrentaria o Guarani. Queria conhecer Alcindo. O goleador destemido, que jogou na Copa de 66. Como todos, fracassou. Mas, era ídolo em Lages. O Vermelhão estava lotado. Olhares atento ao pequeno João Severiano, no lageano Áureo e em Alcindo. Atravessei a multidão, cheguei no alambrado e vi todos os jogadores de camisetas brancas. Batiam bola, faziam bobinho, trocavam passes. No entanto, um jogador vestia uma c amisa diferente. Linda. Três cores em listras verticais. Azul, branca e negra. Uma combinação magnífica. Conhecia o Grêmio só de ouvir falar. Número 13 nas costas. Perguntei quem era aquele. 'Alcindo!', me responderam. Os meus olhos distraídos voltaram a olbar o campo. Foi o tempo de ver a matada no peito, a girada do corpo, o chute forte, seco, certeiro e o balançar do travessão. A pequena multidão aplaudiu. Sorri ao ver o chute de Alcindo. A alma em excitação e o coração que escolheu um time para sempre: Grêmio! Grato, Alcindo!
O tempo voou. Mudei, mudamos todos. A vida tem os seus caminhos os segredos, os mistérios. O teatro de grama e paixão continuou mágico, envolvente, amoroso. Virei jornalista. Fui cobrir o Mundial de Seniors em 87. Vi Pelé, Rivelino e Babington. Deixei de ser jornalista, virei torcedor ao ver Alcindo. Fiz uma entrevista emocionada, ganhei um abraço, e, no meio de todos os jornalistas, pedi um autógrafo. Um troféu que está em algum canto da casa da mãe.
No início de outubro de 98, a melhor notícia de toda a vida: Elaine estava grávida. Se for menina uma dúvida entre Ana Lydia e Maria Carolina. Menino, pensei rápido. Tem que ter Renato, o maior de todos os gremistas. O outro nome, já que gosto de dupla, Alcindo. Nem conversei com a Elaine. A poesia entre Alcindo e Renato só rimava no campo. Alcindo era um nome de outro tempo. A sonoridade de Renato combinava com André. Queria um ataque com três. Elaine vetou Éder. Ficou André Renato. Hoje, o meu ataque dos sonhos detesta futebol. Quem sabe um neto se torne Alcindo. Porém, é uma outra história, outro tempo. E, quem sabe, o futebol se torne só uma lembrança de um velho sem memória?
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