Mauro Pandolfi
Desigual.
De um lado, um time poderoso. Forte. Preciso. Líder. Dono do jogo. Tem o
controle da partida. Acelera, cadencia, acelera. O ritmo é seu. Mortal
no ataque. Goleadores pelos lado, pelo centro. Sempre trabalha os
lances. Defesa intransponível. Marcação firme, segura, rápida. O
adversário encurralado. Planejado. Arquitetado. Treinado. Soberano. De
outro, uma equipe fraca. Confusa. Insegura. Medrosa. Sempre dominada. O
gol é uma ilusão. Ocorre como um acidente. A defesa se esfarela no
primeiro erro. Desmorona como um castelo de cartas. Lanterna. Perdedor. A
vitória do primeiro é garantida? Não no teatro de grama e paixão. O
impossível não existe com uma bola em campo. Davi e Golias explicam a
derrota do poderoso? Ou é necessário buscar os mistério e os segredos do
futebol? Soberba? O medo do fracasso é uma justificativa? Ou é só uma
zebra? Este é um belo, fascinante dilema do futebol!
Niké
ou Nice é a deusa da 'vitória' para os gregos. Representada por uma
mulher alada. Para os romanos, era Victória. Nos confrontos decisivos, a
deusa era glorificada. A derrota gerava um transtorno. Nos embates, os
guerreiros passaram a temer a luta. Isto gerou o pavor de não vencer. O
fracasso. É uma espécie de síndrome nos dias de hoje. Quanto mais perto
da glória, mais próximo do revés.:'O medo de ser feliz', apavora,
desequilibra, perturba. O que era 'vitória' torna-se um drama, uma
paixão que encanta o futebol.
A
soberba. O mais perturbador pecado capital. A certeza. Ausência de
dúvida. A cegueira que briga com o fato, a verdade, o inexplicável. O
orgulho, a presunção, o menosprezo, a arrogância que derrota os melhores
na luta. A falta de concentração (a moderna desculpa depois de um jogo
perdido), a desatenção, a indolência são só justificativas.. O futebol
tem os seus paradoxos. Cultua a soberba dos campeões, dos maiores, dos
craques. Eleva a vaidade. Transformam em mitos e não toleram as
perdas. Quantos times e jogadores são malditos, amaldiçoadas, sinônimos
de derrotas. É a crueldade da bola.
Ligo
para o meu amigo Rai Carlos, o vidente cego, para explicar-me as
derrotas dos gigantes. "É bíblico. Davi e Golias não é um chavão. É uma
metáfora, uma alegoria do homem contra o homem. Não é só a luta em si. É
armadilha divina da superioridade. Não há nada maior e não há nada
menor. A vitória é do mais eficaz, persistente, lutador. O soberbo é um
fraco. Sabe que será derrotado. Cria a imagem de superior para assustar
o oponente. Só consegue quando o adversário entra amedrontado pela
empáfia. O medo é o outro componente da derrota. Fica apavorada com a
possibilidade de não vencer. Murcha, se esconde, até a primeira porrada.
O futebol é assim, Mauro!", comenta. Antes de desligar, Raí dá a
gargalhada e arremata:"Tudo amarelão, Mauro! Paúra, medo, se borram nas
calças com a dificuldade. Tudo bunda mole!'. Rio e escuto;'Quando é
contra o nosso time, é zebra! O imponderável é o melhor lado da bola. O
mais inesquecível!", completa.
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