Mauro Pandolfi
Quinta-feira.
Noite quente lá por fevereiro de 1974. Bar do seu Chico. Rua Irmã
Laurinda, Copacabana, Lages. Céu aberto de uma triste cor verde oliva.
Calça boca de sino, camiseta dos Beatles, medalhão no peito, Roberto
Carlos na vitrola. Doce alienação do país, do mundo, da vida. Em alguns
momentos, a ignorância é uma benção. Lia os Pasquins do Mário pelas
piadas, as mulheres bonitas, os cartuns. O tempo passava lentamente
naquele verão. O Mário estava de folga da base. Nos encontramos no bar.
Era o lúdico lugar das turmas de Copacabana. Sem parceiro para uma
partida de pebolim contra os amigos Gustavo e Miguel. Mário me convidou.
Eu fui. Sou péssimo no pebolim até hoje. Acho que só botão que fui um
bom jogador. Era craque, modéstia à parte.
Mário
questionou a posição dos jogadores. São três defensores e quatro no
meio. "Prefiro dois na defesa e cinco no meio. A marcação é melhor", me
explicou. Questionado, seu Chico argumentou que esta é a nova disposição
dos fornecedores de mesas de pebolim. "Tenho que acompanhar a evolução.
Não sou poste para ficar parado", gargalhou o seu Chico. Olhei ao redor e
notei as mudanças. Uma tevê no lugar do rádio. A vitrola era nova. Os
balcões de madeira trocados por fórmica. Pintura e posters do Inter de
Lages e do Vasco. Um brinco, como se dizia naquele tempo.
"Fica aí na frente. Chute de primeira. Dê porrada. A defesa é comigo",
me disse o Mário. Estava confiante. Mário é o melhor jogador de totó
(como ele chama o pebolim) que conheço. Gustavo e Miguel eram ótimos. A
bola é solta. Errei o chute. Gustavo aproveitou e fez um a zero. Olhei
para o Mário esperando uma bronca. Recebi uma sorriso confortador.
A
bola volta ao jogo. Acertei. Estourou no lado do gol. Miguel rebate.
Mário apara a bola. Toca de um lado para o outro. Uma tabelinha de
zagueiros. Recua para o goleiro. Miguel marca bem. Devolve para o
defensor central. Para. Gira com força a vareta e dispara um canhão. Os
meus jogadores estavam erguidos. A bola passou rápida, furiosa e
estourou no gol. O barulho foi intenso. 1 a 1. Levantei a cabeça. O bar
todo estava ao redor da mesa. E, o pessoal torcendo, vibrando e a
cerveja rolando. Aproveitei um descuido do Mário e bebi um copo. Ele não
deixava, pois era eu só um piá. Preocupação de irmão mais velho que continua até hoje.
Acho
que a cerveja serviu como 'doping'. Os gols demoravam a sair. Durou
tempo a partida. De repente, três a três. Última bola. Gustavo faz um
movimento na bola com o dedão. Ela saiu em rosca, para o seu lado. O
chute é bem defendido pelo Mário. A bola vem lenta. Gustavo erra. Girei a
vareta rápido. A bola é certeira. Explode no gol de Miguel. Golaço! 4 a
3! O Mário me abraça. Me senti um craque. Repetimos a parceria outras
vezes. Nunca mais fiz um golaço como aquele. Apresentei o pebolim ao
André e o Pedro. Jogamos algumas vezes. Mas, eles preferem jogar com o
tio. Eles preferem o talento.
Bah Mauro, precisamos formar uma dupla para enfrentar André e Pedro... Que tal?
ResponderExcluirGrande abraço.