quinta-feira, 25 de junho de 2015

República das monarquias

Mauro Pandolfi

"Nesta que terra que piso, neste povo que amo.
O que eu sou, o que eu sou, o que eu sou??
Sois Rei! Sois Rei"
Bordão de Jô Soares no tempo que brincava de 'Reizinho', ridicularizava os donos do poder e não queria ser o bobo da corte.

Que mistério é Pelé? A bola é só uma lembrança. Não balança as redes há mais de trinta anos. A camisa dez, branca ou amarela, é uma peça de colecionador. Os seus jogos não passam nas tevês. São encontrados no youtube ou nas estantes de loucos por futebol. É endeusado, amado, reverenciado por gente que nunca o assistiu num campo de futebol, ou mesmo, ao vivo, na tevê. Pelé é mito, divindade, sinônimo de futebol. Pelé é eterno.

Que magia tem Pelé? Ninguém será como ele! É um mantra que repete-se sempre que surge um candidato a Rei. Garrincha nunca ameaçou o trono. Zico não conseguiu superá-lo. Diego Maradona o desafiou. Sempre sugere que é melhor. A comparação esbarra no 'fanatismo religioso'. Falam nos títulos mundiais, nos mais de mil gols e na vida desregrada do argentino. Tratam como se fosse um embate entre o sagrado e o profano. Entre os dois, é difícil dizer quem é quem.

Pelé é Pelé! Rei! A mitologia nunca será ameaçada. O reinado já é! Afinal, o que é Lionel Messi? Um fantástico artista do futebol. Um mortal goleador. Um bailarino em dribles impossíveis. Um mago na arte do passe. Um conquistador de títulos. Todos os seus jogos são mostrados ao mundo inteiro. A história viva. Aparecem seus erros, os acertos, a genialidade. Messi é o craque visível. Todos que amam o futebol acompanham a sua trajetória. Pelé é o gênio da história oral. Mais contado, lido, fantasiado do que visto. Pelé é eterno! Messi trilha a sua eternidade. Ele já é do tamanho de Pelé. Ou, será o futebol um esporte que o tempo parou?

Teve o reizinho do parque e o de Capoeiras. Num certo amistoso de seniores, o pequeno Balduíno engoliu o grande Rivelino. Foi só um jogo. Mas, foi glorioso. No Rio, o trono teve várias dinastias. A mais duradoura foi de Zico. Romário e Renato travaram um belo duelo. O trono não era tão valorizado assim. Afinal, até Joel Santana se proclamou Rei do Rio. Nem vou falar de príncipes. Cada semana surgia um. Nenhum tornou-se rei.

Quantos reis cabem numa República? No Brasil, milhares. Andem pelas ruas, calçadas, observem as lojas, ambulantes e notem que há reis de várias dinastias. São gourmets, artesãos, mecânicos, lojistas. Todos reis! Há rei da picanha, do martelinho, do frango, das tintas. Rei dos tecidos, da mandioca e do sorvete. Reis de todas as monarquias. Reis de todas as matizes. Às vezes, paro, penso que o baile da Ilha Fiscal nunca terminou e que o Marechal Deodoro da Fonseca virou para o lado e dormiu. Então, quem é o rei daqui?

Detalhes nem tão pequenos revelam uma monarquia que resiste. Na música, há rei de todos os ritmos. 'Conga la conga' e 'bom para o moral' foi um dueto entre Gretchen e Rita Cadilac. Disputaram trono e quem tinha a bunda mais afinada da música brasileira. As imagens dos rebolados são inesquecíveis. Luiz Gonzaga sempre foi o Rei do Baião. Já Roberto Carlos é o mítico Rei da Jovem Guarda. Os jovens das belas tardes de domingo continuam fiéis ao Rei e a juventude esquecida pelo tempo.

O Festival de Besteira que Assola o País (o Febeapá, imortal criação de Sérgio Porto, um rei do humor. Vá ao google e pesquise. Alguns artigos e personagens continuam atuais. É um sinal que o Brasil está parado eternamente em berço esplêndido) tem a Rainha Mãe, Dilma Roussef, como imbatível. Quem colocou os Incas no México, saudou a mandioca, falou em mulheres sapiens e criou um plano econômico que quebra desde lojinha de R$ 1,99 a um país dificilmente perde o trono.

Porém, apareceu um grande candidato. O ex-jogador e comentarista, Mário Sérgio, afirmou que "Messi é de lampejos e Marcelinho Carioca era mais consistente e jogador" que o craque do Barcelona. Um dos poucos lampejos de Mário Sérgio foi no Mundial de Clubes de 1983 jogando pelo Grêmio. No mais, foi um destes falsos craques da camisa dez. Senão derrubar a Rainha Mãe, ele pode competir com Jô Soares pelo cargo de bobo da corte.

A monarquia parece um sonho, um desejo. Há tantos reis por aí. O Rei Momo é um monarca da farsa alegre. É o Rei do Carnaval. Transforma realidade em fantasia. É o inverso do período eleitoral. Onde a fantasia é vendida como realidade. E, o 'Rei' eleito, não tem a graça do Momo. Há reis de palestras, de negócios, das maracutaias, de eventos. Gente que perdeu o trono. Mas, não quer deixar de ser majestade.


Falei tanto em rei. De todas as dinastias e matizes. Do futebol, da música, da vida. Reis da praia, da primavera, do verão. Reis do apito, da lambada, da cerveja, da cocada preta. Reis dos bailes. Rainhas dos lares. Sei que a minha mulher rejeita o trono do lar. É mais uma primeira ministra. Ontem chamou os filhos de 'reis da bagunça'. Fiquei em silêncio. Não sei qual o meu papel neste reino. Um velho rei sem trono? Um bobo da corte sem imaginação? Um republicano conspirador preso numa masmorra? Ou, só alguém que não sabe como terminar este texto. 

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