Demorei para entender o
olhar para os telões dos estádios a cada gol de Cristiano Ronaldo. Cena repetida.
Pernas abertas mãos erguidas, olhar ao céu, céu dos deuses do futebol. Um mero
narciso do século XXI a se olhar no espelho cibernético, contemplando sua face
alegre, tão feliz como o grito de gol dos milhares de torcedores.
Mas, depois de muito
ver sua arte dos pés pelos tubos, entendi que não era um simples olhar para si
mesmo. Voltava sua perspicácia aos telões para ver as pinceladas de sua arte de
fazer gols eternizada no plasma. Um “expressionista” de si mesmo.
Revi os conceitos. Os
conceitos imutáveis são radicalismos tacanhos próprios dos ranzinzas, que não têm
idade. Mudar, às vezes, depende do tempo e do que se extrai dele.
Seis gols em dois jogos
decisivos. Uma marca incontestável. Gols de pênalti dirão os ranzinzas. Pênalti
faz parte do jogo e do gol. Ouse perder e vem a execração. Hoje, mais uma vez vociferarão
alguns, meramente mais um gol. Mas foi
uma pintura expressionista do dono do espaço.
Cristiano Ronaldo
domina uma bola espirrada da defesa, impensada, menos para ele, ajeita o corpo,
esguio, olhar altivo para o gol e goleiro, faz a barreira corporal no marcador,
libera todo o espaço no exíguo tempo de raciocínio. Sem olhar para os pés sai o
chute seco de peito do pé. O couro da chuteira pincelando o couro da bola.
Voadora. Bola ligeira num sonoro roçar da rede inflada pela potência que
inflama. Torcida efusiva. Gol do craque.
Não consegui saber se o
algoz do adversário mirou-se no plasma do estádio, certamente querendo rever
sua obra. Apenas contemplei o repetir do lance por várias câmeras. Num olhar
mais ousado aprendi que somos todos narcisos do plasma. As redes sociais com
seus aplicativos, sejam eles quais forem, transforam o comum num adorador de si
mesmo. Da sua obra. Do que escreve, desejoso para ser lido e visto. Não escapo
disso. Sou um mais um deles. Um narciso do plasma.
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