Mauro Pandolfi
“A
verdade histórica não existe. A História não é mais do que uma ficção.
Quer dizer, uma ficção com mais dados, concretos, reais, mas também com
muita imaginação.”
A
frase de José Saramago é uma boa descrição de Pelé, assim como a visão
de Sigurd Larsen sobre o Rei do futebol. O que importa é a magia, o
encantamento do conto. A 'verdade' pode ser só um engano.
Pelé!
Não precisar dizer mais nada. É o futebol! Nunca vi em campo. Assisti
algumas vezes, ao vivo, pela tevê. Procuro no YouTube os jogos perdidos do Santos,
do Cosmos, da mágica seleção de 70. Li muito sobre ele. Toda a
mitologia que o transformou em Deus da bola. Único, onipresente, eterno.
Conversei com pessoas que assistiram seus jogos. Contam lendas que
transformam verdades em histórias. Preciosas, líricas, épicas. Esta
semana conheci Sigurd Larsen. Um sueco que assistiu a gênese do mito. O
início do futebol. A estreia de Pelé, como titular, em Copas do Mundo.
"Aquele gol contra País de Galês é o mais bonito que vi num campo de
futebol. Todos falam do drible, do chapeuzinho, como dizem vocês, do
chute. O que me chamou a atenção foi o movimento de Pelé. Ele estava no
meio do campo. A bola era jogada no lado esquerdo. Pelé partiu feito um
aríete. Não prestaram atenção nele. Ninguém o percebeu. Acho que só eu
prestava atenção. Não gritei pois torcia para o Brasil. Pelé
invadiu a área, recebeu a bola, driblou um e fuzilou o goleiro. Nunca vi
gol igual aquele. Me emociono em lembrar", revela Sigurd Larsen, a
'testemunha ocular da história'. Achei que nunca usaria a frase
lendária do Repórter Esso. Agora, quem se emocionou, fui eu!
Ele
não acompanha muito futebol. Mas, Pelé é inesquecível. "Logo ao entrar
em campo notei que era diferente. Não parecia um jogador de futebol. Era
um atleta como Emil Zatopek. Não tinha barriga feito os outros", ri de
sua observação. Pergunto se Messi é melhor. "No, não, incomparável.
Pelé és único!", retruca numa portunhol 'gingado'. Parecia que a sua
certeza era para agradar os brasileiros que o recebia. Falei, para provocar, que
considerava Messi superior. "Está enganado. No, não, niet! Pelé és
Pelé!" reafirmou. É Torcedor do Idrottsforeningem Kamraterna Gotemburgo
(O IFK) - 'nome destroncado', diria um antigo comentarista ilhéu -, 'os
anjos', 'os camaradas', como são conhecidos . Bianca disse que o pai
lembra de mais um brasileiro do futebol. Garrincha? perguntei. " O das
pernas tortas? Grande, grande, grande! É de Marta que falo. Linda,
estupenda, fantástica!" Ficou intrigado com a minha surpresa. "Não
gosta dela?", indagou. Gosto! O futebol feminino é tão estranho por
aqui. Acompanhamos a cada quatro anos. Depois, some sem deixar
vestígios, expliquei
.Sigurd
Larsen é o pai de minha prima Bianca. Ela o conheceu há pouco tempo
quando foi morar na Irlanda. O encontro gerou uma história muito bonita.
Pai e filha se conhecendo, se reencontrando, inventando uma relação
amorosa típica de filme (Bianca é diretora de arte de cinema), de
contos, de romance. Bianca nos apresentou numa noite de pizza na casa de
minha mãe. Muitas histórias, risadas, descobertas. Aos 81 anos, Sigurd é
um aventureiro. Viaja sozinho. 'Está no sangue viking", explicou. Já percorreu o Caminho de Santiago de Compostela algumas vezes.
"Muita energia, não no sentido religioso. É o reencontro com você mesmo.
Na viagem, há meditação, a tua vida, seus sonhos, desejos, mudanças".
Sigurd é uma doce pessoa. Alegre, gentil, educado, adorável.
Fisicamente, lembra muito Jacques Tati em seu filme 'Férias do Senhor
Hulot". Volte em breve, Sigurd!
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