terça-feira, 12 de junho de 2018

...A primeira!



"Tudo é inverossímil enquanto não acontece pela primeira vez. Quem há de acreditar em coisas que ainda estão por vir?"
Charles Bukowski é o poeta que entende a alma de um jogador. Não importa se é de poquer ou de futebol. O primeiro título é indecifrável, mágico, quase inverídico. O espetacular Hazard acredita que a Bélgica pode buscar o impossível.

Mauro Pandolfi

Quem vai ganhar a Copa? Rai Carlos, meu amigo vidente cego, não quis confirmar. Foi enigmático na resposta. "Está entre quem luta pela primeira vez vencer e quem tem a receita perfeita para perder!" Não precisa ser especialista em charada para decifrar a frase de Rai. Bélgica e Argentina?, perguntei. 'Você que está dizendo. Não sou eu! Mas, pense, reflita, análise, que entenderá o que eu disse". Bebeu calmamente o gim, deu um abraço e foi embora. Copa do Mundo é um diamante raro no mundo do futebol. É o ápice do esporte. Jogar já seria o suficiente. É o máximo para o Panamá e o Irã. Pouco importa para o Brasil e Alemanha apenas participar. Só a vitória torna o evento glorioso, inesquecível, para sempre.
1958. O Brasil levou 20 anos para ser campeão. Lêonidas da Silva assombrou o futebol em 1938. Mesmo jogando com a chuteira rasgada, o 'Diamante Negro' foi o craque da Copa. O já fantástico Brasil ficou em terceiro. A guerra impediu os mundiais de 42 e 46. Em 1950, as 'toruradas de Madri' invadiram o Maracanã. Zizinho era um mestre na arte de jogar. Obdúlio Varela conduziu um improvável Uruguai ao título. Pelé, o menino Édson, cumpriu a promessa que fez a o pai Dondinho. O resto da história todos sabem.
A França levou décadas para entrar na galeria dos campeões. Nem em 1958, o timaço de Just Fontaine, nem o quarteto de dez de Paltini, Giresse, Genghini e Tigana conquistou o título em 1982 e 1986. Faltou pouco, quase nada. A honra coube a França multirracial comandada por Zinedine Zidane em 1998. A Espanha esperou um pouco mais que os franceses. Sempre candidata. Para ganhar a Copa juntou a melhor geração de sua história. O extraordinário Iniesta foi o condutor da vitória. Já a Holanda desperdiçou seus vários talentos. Nem Cruiff, nem Van Basten, nem Berkamp, nem Robben levaram o título para casa. E, agora, os holandeses vão ver a Copa de casa. Como é cruel o futebol!
Chegou a vez da Bélgica? A melhor geração em uma Copa. Uma espinha dorsal magnífica, de estrelas de primeira grandeza. Começa em Courtois, passa por Kompany, chega em Hazard, brilha em De Bruyne e se transforma em gol com Lukaku. E, se a coisa não funciona, há sempre Fellaini, uma espécie de Jael. 'Os deuses do futebol' adoram estes 'craques'. A Bélgica é uma síntese da mistura racial que forma a atual Europa. Há os filhos de imigrantes, de estrangeiros, os belgas, todos formando um esquadrão espetacular, o time da 'moda', o favorito de quem ama o jogo, dos especialistas, dos curiosos, como eu. Cuidado com a Bélgica, Tite!
César Luís Menotti não era um técnico comum. É um homem culto, leitor de Borges, fã de Piazolla, de posições políticas firmes. Porém, cometeu o mesmo equívoco que qualquer Lazaroni ou Parreira cometem. Deixar um garoto de fora. E, não um menino qualquer. Era Diego Armando Maradona. No entanto, Menoti ganhou a Copa. 1978 é um dos mundiais mais complexos, duvidosos, conturbados da história. Maradona carregou a Argentina em 1986 e o impediram de vencer em 1990 e 1994. Lionel Messi tenta mais uma vez entrar no coração dos argentinos. Busca a consagração. Só a Copa dará o verdadeiro valor que Messi tem. Tomara que os 'deuses do futebol' abandonem a crueldade com os gênios.
Um time desorganizado, afoito, perdido, com estrelas decadentes mais famosas do que talentosas, confuso, brigado com a imprensa, um treinador - Sampaoli - acusado de assédio, brigas internas, convocações duvidosas, sem confiança dos torcedores, no grupo mais difícil da Copa. Eis a receita do fracasso, da eliminação da primeira fase. O mesmo cenário da Itália de 1982 e da França de 1998. Será que a história se repete como farsa ou como glória? Ah, a Argentina tem Lionel Messi. Ele é o dono do jogo. Será que o sorriso de Rai Carlos quando citou o 'time que tem a receita para perder' é um sinal de vitória?

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