Mauro Pandolfi
O
goleiro rola a bola para o lateral esquerdo. Ele passa para o zagueiro.
A bola segue de pé em pé até chegar no meia. Domina, um passo e um
passe perfeito. Milimetricamente desenhado. Na área, o atacante recebe.
Rápido, toca de calcanhar. O centroavante invade e fuzila o goleiro. 20
toques. 10 jogadores. Um gol de passe. Um gol que descrevo como
anônimo. Não sei o nome de todos os jogadores do Atlético Nacional que
inventaram o lance. Sei que o passe magistral foi de Torres. Quem toca
feito um Sócrates é Moreno. O autor do chute fatal é Borja. Se eu fosse
um narrador, este texto seria mais poético, lúdico e eufórico, talvez
terminasse o lance assim: "Gooooolllll!!!! (a garganta explodiria nos
inúmeros eles). Gol do futebol. Gol da magia. Gol do novo. Gol antigo.
Gol desenhado. Gol em verso. Gol em prosa. Gol mágico. Gol que eu
gostaria de ter feito. Gracias, Atlético. Gracias, bola. Gracias, vida.
Que bonito é o futebol!"
A
bola suspira por pés mágicos. Com asas na chuteiras desfila a sua
alegria. Os dribles tornam os jogadores Chaplin. Para lá, para cá. Vai,
volta. Engana. Chiko Kuneski é um apaixonado pelo drible. Valoriza,
salienta e traças linhas poéticas que driblam a aridez do futebol atual.
Eu prefiro o passe. Gosto do jogo planejado, arquitetado, pensado. O
passe tem a beleza da prosa. Sempre vai. Quase nunca volta. A bola tem
um rumo. Guiada para o fundo da rede. Este gol do Atlético Nacional é o
mais encantador do ano. É o futebol em seu estado mais lírico, lúdico,
brincadeira de meninos. Não vai ser eleito. Aparecerá um chute
maravilhoso ou uma jogada individual de vários dribles. O passe é o
lance 'marginal' da bola. Às vezes, ignorado. Raros os momentos que é
tratado como arte.
Não
vi o gol ao vivo. Só nos melhores momentos do jogo. Troquei o moderno
futebol, o melhor das Américas, do Nacional, pela paixão tatuada na
alma.
Fui ver o Ypiranga. O meu primeiro time, a primeira camiseta, o
primeiro amor. A magia daquela camisa era o número sete bordado pelas
mãos ágeis da tia Nelcy. Vibrei, pulei, torci, sofri. 832 pessoas
assistiram no estádio. Milhares no Brasil. E, toda Erechim fez uma
festa. Nem o poderoso Fluminense impediu o 'canto' do Canarinho. O sonho
de ir longe na Copa do Brasil é só um sonho. Mas, às vezes, os deuses
da bola ficam distraídos, sonolentos ou galhofeiros. Quem sabe, o
Ypiranga se torne uma Islândia. Erechim é muito fria. Às vezes, tem
neve. E, aquele céu colorido do final da tarde, tão belo, é Aurora
Boreal?
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