Mauro Pandolfi
A
bola alta na área. Solta, despretensiosa, perdida. O 'diez' está
atento. Corre em direção ao goleiro. Antecipa o pulo. Com um toque
sutil com a mão desvia. Ao iludido goleiro resta só observar a bola
chegando macia na rede. Gol com a 'mano de dios'. O lance mágico de
Diego Maradona tem trinta anos. Ele tem orgulho do feito. Anda de queixo
erguido, brilho nos olhos, sem o menor remorso do ato ilícito. Cinismo
ou seria apenas uma malandragem que a bola permite, incentiva, aplaude?
Será que Maradona repetiria a cena hoje? Acredito que sim! No entanto,
ela não seria vista como um 'feito, uma catimba'. Seria execrada. Um ato
que fere a ética. Desonesto. O futebol anda chato. Não sei se é pelo
jogo mal jogado ou pelas restrições de opiniões, piadas, pelas normas,
regras de conduta, comportamento? Até os apelidos desapareceram. Há
nomes compostos. Para dar um ar de seriedade ou alguém contrataria um
tal de Bilau, artilheiro do São Raimundo na série D? Afinal, o São Paulo
desistiu de contratar Milton Caraglio. Não pelo futebol. Como disse o
José Simão, 'foi pela piada pronta'.
A
bola vem alta na área. Solta, despretensiosa, perdida. O 'diez' esta
atento. Corre em direção ao goleiro. Não alcança. A bola passa, rumo a
linha de fundo. Lionel Messi não é Maradona. É incapaz de um ato
desonesto no jogo. Fora, é outra história! Messi tem uma cara honesta. É
ético. Ele sabe que o futebol tem uma nova ordem. Seria criticado,
amaldiçoado, demolido. A ética da vida social é a mesma do futebol? Ou,
vale tudo pela vitória? Os torcedores reclamam do fairplay. Tanto a
favor, quando seu time pratica. E, contra, quando o adversário ignora.
Ele ainda sonha com a vitória com um gol impedido, com a mão ou no erro
da arbitragem. Mas, repudia o 'engano' do juiz na derrota. O torcedor é
um cínico!
A
bola com atacante. Domina, faz embaixadas, olha o adversário, baila
para um lado, volta. A reação é forte. Recebe uma entrada violenta. Dedo em riste,
cobrança. Humilhação. O adversário não admite o drible, o chapéu, a
risada. Sente-se desrespeitado. Há jornalistas que concordam. Pedem
respeito, seriedade, juízo. Ah, às vezes, o árbitro dá um cartão
amarelo. Não para quem agrediu, ameaçou. Para quem brincou com a bola,
com o futebol, com a alegria. É preciso ética no jogo. Não algo que
interfira na 'mágica', no dom de iludir, na astúcia de um ilusionista.
O
politicamente correto trafega na perigosa fronteira entre a virtude e o
puritanismo. Um pouco para cá, justiça. Um pouco para lá, moralismo. No
futebol, é mais complexo. A vitória, exigida pelo torcedor, pode ser
conquistada a qualquer preço? A derrota é sempre maldita. Uma simulação
de falta, pênalti cavado, um gol com a mão é uma desonestidade. O erro
da arbitragem é um equívoco, engano, ilusão'. Aliás, no jornalismo atual, 'suposto equívoco'. Maradona, com o 'mano de
dios' foi um canalha, um 'bendito canalha!', para os amantes da
esperteza, da malandragem, dos catimbeiros. E, o título que Márcio
Rezende tirou do Santos e deu ao Botafogo, o que é? O lance de Maradona é
fantástico. Maravilhoso! O 'equívoco' - desculpe-me, 'suposto' - de Márcio Rezende é um 'erro
humano'!
Estou em dúvida: sou um fundamentalista correto ou um
cínico iludido pela bola?
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