domingo, 2 de agosto de 2015

O pesadelo

Chiko Kuneski

A vida sempre lhe foi um sonho. De ser jogador. Famoso. Nos campos improvisados da rua se impunha. Era de porte. Tinha porte. Rápido, muito mais do que sua adolescência explicava, jogava como titular no time da cidade. Mas a cidade era pequena demais para seu sonho. O time também.

Sonhava em ser internacional. Não local. E a cada bola disputada via o futuro que a juventude vislumbra. O sucesso. Jovem demais para entender que o sonho nem sempre vira sucesso. E o sucesso nem sempre é o sonhado.

Até que a realização do sonho chegou. Chegou-lhe ainda moço, juvenil. Jogar num grande time do Brasil. Todos os chutes para impedir o gol. Todas as marcações para impedir o gol. Todo treino para ser o que se destacasse em impedir o gol, a bola na rede, o grito eufórico da torcida valeram a pena.

O sonho se materializava. Era o passo para ser um jogador internacional. E o acordar do sonho seria fora da cidade, fora do estado, fora do país. Acordaria seu sonho sonhando.

Na estréia o nervosismo da realidade tremeu-lhe as pernas. A vida real é bem mais cruel do que imaginamos. Era apenas um amistoso. Para os demais em campo apenas mais um jogo. Para ele o sonho real. Tinha que ser o melhor.

Mas o sonho acaba quando acordamos. A bola chutada para área acordou o sonho da sua vida. Logo a bola, que dormia abraçada com ele desde menino. Foi real, traiçoeira. Cruel no giro. Cruel no toque. Cruel no som do estufar a rede.


Solitário, sem mais seu sonho de ser um zagueiro internacional, teve tempo de virar a cabeça e ver a cruel bola envolta pela realidade que marca o gol. Foi contra. Seu primeiro e único gol. Contra.

Nenhum comentário:

Postar um comentário