Mauro Pandolfi
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Julião, presta atenção! Esquece o jogo. Cuida só do Marcelo. Cola nele.
Não deixa jogar, não larga ele. Marca forte. Porrada só no meio do
campo. Perto da área, só cerca. O cara é foda, porra! A cobrança de
falta é mortal. Vai Julião, bom jogo!
Foi a instrução de Galo Cego, o
veterano técnico do Estrela, para o seu jovem zagueiro. Ele sabia o
perigo que Marcelo representava. Centroavante habilidoso, de
movimentação e de um chute preciso. A semana toda foi a preparação de
Julião. Galo Cego utilizou o júnior Tunico para fazer o papel de
Marcelo. A marcação de Julião foi tão vigorosa que o garoto foi parar no
departamento médico. "Aquele teórico de merda vai entender que futebol
se aprende no campo, na dureza do jogo, na fúria da torcida. Técnico de
faculdade, porra! Acha que vou perder para canudo. Vou dar um nó tático
nele" , resmungou para o seu antigo supervisor, Noel Caminha.
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Te cuida, Marcelo! O Julião é bandido, carniceiro. Arrasta ele para
perto da área. Aí, velho, cave falta, provoque o cara, tira ele do
sério. Usa os cotovelos. Catimba, porra! O título passa por você!
Amador
Xavier é um ardiloso treinador. É a primeira oportunidade num time
de ponta, o Aurora. Treinou um sistema que deixa fora das ações
ofensivas o seu principal atacante. "O Marcelo vai tirar o Julião da
área e abrir a defesa. O Galo Cego, quando perceber, já estará fodido",
confidenciou ao seu auxiliar, Juninho Peixoto. "Aquele velho é uma
anta", completou rindo com o assistente.
Os times estão lado a lado,
esperando os hinos. Os gritos dos torcedores são abafados pelo som
desafinado da banda do colégio militar. Os jogadores cumprimentam-se.
Marcelo tenta um sorriso para Julião. O zagueiro o encara e resmunga
algo. O árbitro chama os capitães e sorteia a saída.
Começa o jogo. Na primeira bola
lançada ao ataque, Julião levanta o atacante. Uma
entrada violenta. O lance foi próximo da torcida do Estrela. Parecia
gol.´"Julião, Julião", berravam os estrelistas. Já em pé, Marcelo riu
debochado. "Não sou a bola, ô babaca! Tu sabe o que é uma bola,
grosso?". Irritado, Julião ameaçou. "Vem de novo que te arrebento,
bambi!". Salmo Toscano não teve dúvida. Amarelo para os dois. "Vocês não
vão foder o meu jogo", gritou ele. "Boa, Julião", incentivou Galo Cego.
"Porra, Marcelo, não cai na catimba!", pediu Amador.
.E foi assim o jogo
inteiro. Olhares ríspidos, nariz com nariz, cotoveladas, arranhões,
discussões. Toscano tolerou tudo. Não podia desfalcar nenhum dos dois
para o outro jogo da final. Esta foi a garantia dele ao presidente da
federação, Merlin Fonseca. 0 a 0. Tudo para o último jogo. Na
saída do túnel, Marcelo provocou Julião. "Domingo vou fazer um gol te
dando um chapéu, bundão". Foi difícil segurar Julio. "Tenta que te
quebro a perna, pipoqueiro". A polícia acalmou os ânimos.
Dez da noite.
Marcelo sai para jantar. Estava sozinho. Era o único solteiro do grupo.
Escolheu a pizzaria Das Massas, o novo point dos brotinhos. O lugar
estava cheio. Numa mesa tinha um ocupante. Ele reconheceu Julião. O
zagueiro o chamou. "O que é do jogo fica no jogo, aqui fora é outra
coisa", disse. Marcelo agradeceu. Conversaram, riram, contaram
histórias. Notaram que tinham a mesma origem, o mesmo sonho. Escolheram
a mesma pizza: marguerita. Riram com a coincidência. O gosto musical
era o mesmo. Marcelo convidou Julião para irem ao show da dupla Carlos
Bilardo e Juliano. Julião topou. Curtiram a noite, riram, comemoraram e
foram embora. Dois ótimos amigos.
Durante
a semana da final encontraram-se duas vezes. Num debate na rádio DCO.
Os radialistas ficaram surpresos com a troca de gentileza dos dois
jogadores. A outra, por acaso. Uma festa de aniversário de Delmar Lento,
um empresário de atletas. Descobriram que eram agenciados pelo mesmo
procurador. Contaram histórias, riram muito, divertiram. Eram,
definitivamente, amigos.
Domingo. A final. Estádio lotado. As mesmas
instruções. Marcação, porrada, catimba, o blábláblá de sempre. Julião
apertou a mão de Marcelo após o hino. No primeiro lance de ataque, ele
evitou a falta em Marcelo. "Porra. Porra, Julião!", berrou Galo Cego.
Marcelo escapou pela esquerda e perdeu uma bola boba para o zagueiro.
"Qual é Marcelo? Tá afinando?", questionou Amador. Nada lembrava o outro
jogo. Esquerdinha e Rubinho trocaram socos. A briga generalizou. Todos
partiram prá porrada. Nem todos. Julião e Marcelo ficaram escorados na
trave conversando. Toscano escolheu dois de cada lado. "Rua! Ninguém avacalha jogo meu!"
No
intervalo, Julião e Marcelo foram substituídos. "Preciso de um zagueiro
mais rápido", explicou Galo Seco. "Só a vitória interessa. Quero um
centroavante dentro área", justificou Amador. Julião não gostou de ser
sacado. Pegou suas coisa e foi embora. A surpresa foi encontrar Marcelo
lá fora. Indignado, o atacante disse que o "ciclo no Aurora estava
terminado".
Marcelo ofereceu carona para Julião. O carro do zagueiro estava no centro de treinamento do Estrela. Pararam num barzinho de estrada. Pediram para o dono desligar a televisão que mostrava a prorrogação. No lugar da bola, uma música suave. Eles conversaram muito, cada um contou a sua história, seus desejos. Julião tirou na bolsa a velha camiseta do Estrela e deu para Marcelo. 'É meu amuleto da sorte". O centroavante retribuiu com o troféu Bola de Zinco. "Sei que é o teu sonho como jogador. Vi num site sobre celebridades. Aceite!" Comemoraram a amizade com champanhe e abraços
Marcelo ofereceu carona para Julião. O carro do zagueiro estava no centro de treinamento do Estrela. Pararam num barzinho de estrada. Pediram para o dono desligar a televisão que mostrava a prorrogação. No lugar da bola, uma música suave. Eles conversaram muito, cada um contou a sua história, seus desejos. Julião tirou na bolsa a velha camiseta do Estrela e deu para Marcelo. 'É meu amuleto da sorte". O centroavante retribuiu com o troféu Bola de Zinco. "Sei que é o teu sonho como jogador. Vi num site sobre celebridades. Aceite!" Comemoraram a amizade com champanhe e abraços
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Juntos
há quase um ano. Estão próximos de realizar o desejo de todo jogador. A
Europa os espera. "Ju, tu vai ficar um tesão com a camisa rosa do
Palermo", disse Marcelo. "E, você? Todo de amarelo do Villareal. Será o
quindim do meu coração!", comentou Julião. A risada ecoou na primeira
classe. Notaram que estavam sozinhos. Abraçaram-se, beijaram-se
apaixonadamente.
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