quarta-feira, 8 de março de 2017

O milagre impossível


Mauro Pandolfi

O tempo derretendo feito um relógio  de Salvador Dali.  Sem espaço, trancado na muralha humana francesa, sem ideia, nenhuma solução, o Barcelona suspirava pelo acaso. O tempo cada vez mais líquido.  Na arquibancada, olhares aflitos, rostos triscados, apavorados, sem esperança, ocupavam a tela da tevê. No campo, o desespero da goleada sem vitória, da eliminação, em busca de um lance  isolado que se transforme em dois, três gols. E surgiu! Na precisão de Neymar. A falta, a bola, o rumo certo, o gol, a improvável chance. Valeria, no mínimo, pela beleza. Neymar busca na rede a bola. Leva ao centro. É só um ritual. O jogo já vai terminar. Nunca diga acabou antes do apito final. A bola perdida no espaço encontra Suárez e um zagueiro. Um toque sutil, o braço no pescoço, a malicia, a queda, o erro do árbitro, o pênalti.  Neymar, o sonho,  o desejo, a batida, o gol. Os franceses hipnotizados. Perplexos. Assustados. Medrosos. Não resistem. A vitória vem de Neymar. O passe preciso, o vôo livre de Sergi Roberto, o suave toque que desvia do goleiro. Fatal. Mortal. A festa, a glória, o poema épico do futebol.  O teatro de grama e paixão explica a vida como ninguém. A superação do Barcelona e o naufrágio francês ficará na memória de quem viu o jogo, de quem ama o futebol. Eu adoro o futebol!
O PSG foi covarde. Atacou como covardes fingem atacar. Se protegeu na burocracia do regulamento. Desistiu do jogo. Abdicou. Abandonou. Armou a muralha, a resistência, a retranca. Marcou os movimentos, tirou o espaço, ficou sem bola. Perdeu! O perdido Barcelona se encontra na genialidade de Iniesta. A bola sem rumo, quase fora, ele inventa um lance. O toque sutil de calcanhar surpreende o beque francês. Sem jeito, toca para a rede. Era o segundo. O gol da possibilidade, da persistência, do desejo, do imponderável. 'Não tá morto quem peleia' é um ditado gaúcho. Deve ter algo parecido em catalão.
Um pênalti duvidoso. A malandragem de Neymar. O corpo na frente. O toque do defensor. Caiu! Messi bate. Tudo é possível. O PSG entra no jogo. Di Maria dá mais vivacidade. Num ataque, Cavani acha o gol. Acabou, pensei! O PSG retomou a muralha. O Barcelona rodava a bola. Sem força, sem imaginação, sem rumo. Mais de trinta minutos de nada. A bola ia e voltava. Deu, gritei num tom de frustração.
Mas, o futebol é como a vida, um programa do Chacrinha (só acaba, quando termina!) e tinha Neymar. As asas de chuteira, na bela expressão de Chiko Kuneski,  revela-se um cobrador de faltas digno de um Zico, o imaginativo que descobre atalho nunca antes visto. O mago da bola. O mais iluminado craque brasileiro desde Pelé. O último lance será a referência de sua carreira. Preciso, milimétrico, parecia ver o lance de cima num drone. A bola suave encontrou um 'voador' para o lance final. O gol mágico, inacreditável, espírita, não foi de Messi e nem de Suarez.  O herói foi um reserva, coadjuvante, o vilão de Paris. Sergi Roberto saiu do campo para entrar na história. Como é nobre o jogo da bola.

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