quinta-feira, 16 de março de 2017

Cemitério de elefantes



Mauro Pandolfi

Vou mexer num vespeiro. Tocar na 'sagrada' seleção de 70. Cometer uma heresia. Ah, gosto, às vezes,  de ser um pouco iconoclasta. Contestarei um 'mito'. O 'canhota', o cérebro, o pensador, o que gostava de levar vantagem em tudo, certo?, Gérson de Oliveira Nunes. Ele garantiu que Neymar seria, no máximo, reserva no timaço do México. E, fez algumas  ressalvas. "Nós tínhamos o Caju, um talento enorme. Na ponta e no meio, jogava muito. Era talento puro. Ele (Caju) rendia dos dois lados da mesma forma. E era banco. Ainda tem isso. Eu não sei se o Neymar teria vaga nem no banco", garantiu o folclórico meia. Eu, fã de Neymar, me socorro de uma outra entidade mitológica: Tostão. O genial, mais culto comentarista esportivo deste país, disse que Neymar pode  ser o segundo melhor jogador da história brasileira. "Só não supera Pelé. Ele dribla, chuta com a esquerda, a direita, bate falta, cabeceia. Tem tudo para ser completo".  Futebol é mesmo um jogo de olhares, de sensações, de sentimento, de paixão, de enganos.
"O Neymar não teria vaga. Ele jogaria no lugar de quem? Não vai ser no lugar do Rivellino. E do Pelé? Do Tostão? Do Jairzinho? No meio-campo também não dava para ele", avaliou Gérson. O 'tá certo?' característico completou a frase. Tirando Pelé,  Neymar jogaria no lugar de qualquer um. Inclusive no de Gérson. O 'tri' de 70, o grande time da história, criou muita mitologia. Há um endeusamento exacerbado em alguns jogadores. Também, uma depreciação em outros. Everaldo, Félix, Brito, são tratados como comuns com sorte de estarem no lugar certo, na hora certa. Enquanto que  Rivelino, Paulo Cesar Caju e Carlos Alberto Torres tornaram-se deuses. Eram 'apenas' ótimos. Mexeria na defesa. Como Piazza estava improvisado na defesa, o substituiria. Ou, tiraria Brito. Clodoaldo seria um defensor. Mascherano joga assim no Barcelona. O futebol de funções terminou. Joga-se com posicionamento. Afinal, este foi o time mais moderno em copas do mundo.
Gérson repete o discurso de todo homem velho assustado com tempo. Rejeita o novo, o atual. Preso no passado, considera o presente um estorvo. Ele vocifera o mesmo blabláblá dos jogadores tornados comentaristas. São os espelhos. Procuram a sua imagem refletida nos outros. Raramente encontram. Ficam enfurecidos quando encontram. Arrumam 'um defeito'. Tostão é diferente. O jogador ficou na memória. Tem o olhar de hoje, do novo, do agora. Somente um livre pensador para desafiar a mitologia, as certezas, a verdade.
Quando entrei do Diário Catarinense, com um 'monte' de jovens jornalistas, escutei de um vetusto editor, com jeito de sábio, dizer : "não se faz jornalismo com focas. Precisa experiência'. Escutei, ri, não liguei. Li recentemente esta verborragia nas redes sociais, em artigos, em colunas, sobre o juveniilismo das redações. 'É o fim do jornalismo', bradam os 'experientes'.  O jornalismo diário virou uma fantasia, um engano, para mim. Mudei de ares, de profissão e a velha tese sobre novatos acompanhou a minha vida. Escutei tantas vezes, em tantos lugares, em ambientes bem diferentes. O futebol é um destes ambientes. Ligue o rádio, a tevê, leia os jornais, escute, os 'catedráticos' exigindo reforços. 'Não podem queimar os jovens. Tem de entrar aos poucos'. Balela! Conversa fiada! Os velhos tem que seguir os elefantes. Saber a hora de sair de cena. A vida, o mundo, as revoluções são  para os jovens. Sempre foi assim. Filho bastardo, perdido, da rebeldia de 68, continuo não confiando em quem tem mais de trinta e estou procurando um lugar para descansar a 'tromba'.

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