Mauro Pandolfi

Contei da festa de sábado do meu afilhado Guilherme. O motivo era
o Figueira. Mas, boa parte dos convidados vestiam camisetas de clubes. A
maioria de colorados. Fui o alvo predileto. Ironizado com educação. A
civilidade dos vermelhos foi comovente. Até foram solidários com a minha 'dor'.
Gente boa, aqueles colorados! Acho que há um certo toque gremista neles. Quem
sabe, um pai, um tio, um filho ou uma ex-namorada que deixou em frangalhos o
coração. No entanto, as vitórias tem algo de soberba. Falavam em como parar o
tridente mágico do Barcelona. A Libertadores já está no papo. Será? Eu sou um
gremista de fé, muita fé, Santa Fé!
"Como eram as camisetas do Inter? Novas? Da Nike?",
perguntou Rai. Confirmei que sim. A sonora gargalhada acordou Pablito.
"Não havia nenhuma de 75 ou 76, Mauro?" Disse que não. Nem as retrô,
falei. "Dos anos 80 e 90 nem sinal, então?". Nenhuma, garanti.
"Ah, torcedores de vitórias e títulos. Surgem aos montes na época de ouro.
São falantes, expressivos. Sempre contentes, com toda a razão. Mas, basta
perder que somem, recolhem-se, desaparecem. Guardam ou doam as camisetas. As
vitórias são para os fracos. Só os fracos vibram com a glória!" O rosto
ficou triscado, olhar tenso, a calma desapareceu. Pediu um tempo e trancou-se
no quarto.
Os minutos voaram. Rai voltou sorridente. "Fui recarregar as
baterias. Sou movido a fé. Fui rezar, Mauro. Fique tranquilo. Está tudo bem
comigo", explicou. "Eu gosto da derrota. A minha vida é uma derrota.
Isto me faz um ganhador. Todas as dificuldades me moldaram, me transformaram no
que sou. O futebol é a mesma coisa. A vitória é passageira. São raras nos
clubes. A maior parte são de derrotas, de falta de títulos, de ídolos. Um dia
vai passar, Mauro!" Achei engraçado o apelo de autoajuda de Rai. Ele não é
disto. "Não é ajuda, meu caro. É vida. Aprenda e ensine seus filhos sobre
isto", disse. É quase meio-dia. Hora de ir embora. Rai me dá um abraço,
beija o meu rosto e se despede.
Não resisto e pergunto: o que gerou o nosso drama? "Escutei
que o estádio Olímpico está agonizando. Destruído e abandonado. É isto. Não
saímos de lá e nem fomos para a Arena. O Grêmio é um zumbi. Flutua entre o
antigo, um coliseu e o novo, moderno, uma arena. Somos um resquício de um
império gremista e um novato imberbe na nova ordem mundial do futebol.
Precisamos escolher uma coisa, de preferência o novo, e destruir a outra, que
seja a antiga.
Se continuar assim como
está, seremos zumbis, um 'walking dead' eterno. A escolha é nossa". Estava
saindo de sua casa. Ele me chama. "Mauro! Quem tem um hino assinado por
Lupicínio Rodrigues, um ídolo como Renato e as cores branca, azul e negra na
sua camisa, não precisa de título. Somos o que somos, porque somos o Grêmio.
Isto basta!" A risada ecoou na rua. É uma verdade e, também, uma bela
desculpa. 'Até a pé nós iremos..." Vou embora assobiando nosso inigualável
hino. Nada pode ser maior.
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