sábado, 2 de dezembro de 2017

Os desajustados

"Eu não sei a que lugar eu pertenço".
É a resposta de Rosalyn (Marylin Monroe) para Perce (Montgomery Clift) personagens do esplêndido filme de John Huston, Os Desajustados. É a história de quem parece viver fora do tempo, do espaço, perdidos, sem rumo, a procura de uma saída. Alguns, encontram.

Mauro Pandolfi

Este texto poderia ser um pedido de desculpas. Mas, não é! É sobre a descoberta de um outro olhar do futebol. Rompeu as minhas certezas, convicções, aumentou as minhas dúvidas. Nada é eterno no mundo da bola. Nem o talento. E, muito menos, a falta dele. As teses existem para serem derrubadas, destruídas, refeitas. Errei em várias análises sobre os jogadores do Grêmio. Reclamei quando chegaram. Usei as suas histórias, as minhas avaliações, os meus olhares, minhas desconfianças. Alguns, mudaram a minha opinião após os primeiros jogos. Outros, só no último. Nada é definitivo num campo de futebol. Heróis, vilões, craques, bondes, pernas de pau, são meras figuras de linguagem usadas num estádio ou numa análise. Não são tatuagens que ficam no corpo de um jogador. Ele pode mudar a sua história. Se reinventar, se descobrir ou aceitar as coisas como são.
Esta reflexão pode ser apenas uma consequência do Tri do Grêmio. Mas, não é! Tento entender a 'magia' da transformação. Qual o segredo de Renato Portaluppi em 'recuperar' almas, restaurar virtudes, atitude, de mudar comportamento, fazer ressurgir talento escondido, heróis improváveis, desajustados ou 'achar' uma juventude perdida? Confiança, respeito, determinação, ousadia. Ou, coragem, por não ter ninguém melhor por perto. Apostou! E, ganhou!
Detesto o futebol de Fernandinho! Ou, detestava? Enrolado, confuso, perdido entre o drible inútil ou o chute torto. Como pode um atacante que não sabe chutar? Este Fernandinho vi no Barueri, no São Paulo, no Atlético e, me desesperei quando foi anunciado pelo  Grêmio. Atacante perto dos 30 anos e com menos gols que Rogério Ceni, eu não aceito. Fracassou, foi emprestado, voltou, foi emprestado, voltou, virou reserva e Renato o reinventou. Tornou-se artilheiro no Brasileiro com bons jogos. Tinha (ou tenho?) restrições como substituto de Pedro Rocha. Até escrevi que ele era 'a negação de Pedro Rocha'. Contra o Lanús foi um Pedro Rocha dos melhores momentos. Rápido, inteligente, tático, e marcou um gol maravilhoso. Fernandinho! É o melhor exemplo do meu engano. Todos que estão no futebol tem uma qualidade. É preciso descobrir, lapidar, gerar confiança, fazê-lo brilhar. Renato fez isto com Fernandinho. Ele virou um definidor mortal. Até quando? Que seja para sempre!
Não é só a qualidade que contesto nas contratações. A idade é outra. Só os 38 anos faziam duvidar de Léo Moura. Três jogos e mudei de opinião. Ele é precioso taticamente. Cícero foi outro. O tempo parado e a idade. Um 'velho' sempre tira o lugar de um jovem promissor. Patrick e Jean Pierre perderam lugar para Christian e Jael. Pô, Renato! Protestei no facebook. Ah, Jael!  Gostei da contratação. Depois de alguns jogos, contestei. Outros jogos, aprovei. Certezas absolutas até mudar de ideia.. Reclamei de Barrios. Muita grife e pouco jogo. Ri com as contratações de Edílson (muito doido!) e de Cortez (ainda joga?). Loucura! Até com Kannemann me enganei. O futebol é mesmo um teatro de grama e paixão. Há os que superam as desconfianças e medos. Improváveis 'heróis' de finais. É a magia do jogo, do homem, da vida.
Agora, um segredo - é segredo, pois poucos me leem! - que escrevi quando Roger Machado pegou o boné e disse adeus. Não gostei da contratação de Renato Portaluppi. Bom treinador nos dois períodos do Grêmio. Um bem ofensivo; o outro, quase uma retranca. Mas, havia uma réstia de moderno nos seus times. Não como Roger, um leitor de Pep Guardiola. Estudioso, educado, discreto, renovador, bom discurso, novas palavras. Gostava de Roger! Enquanto Renato ainda 'perdia' o tempo na praia, no futvolei, um grande e sábio bon vivant.
Escrevi isto: "Renato retorna mais uma vez. A terceira! Infelizmente, não como jogador.  A saudade, o passado não é uma fonte da juventude. Que pena!  Volta como técnico sazonal. O homem que resolveu tirar férias trabalhando.  Ao contratar Renato Portalupi e Valdir Espinosa, o Grêmio  disse adeus ao presente, abandonou o futuro e tenta reencontrar uma gloriosa era de vitórias. Que só existe nos almanaques, nas memórias ou num pensamento mágico de um cartola". O tempo revelou a certeza da aposta. E se, hoje, tivesse que optar por um dos dois, ficaria com Renarto. Desconfio que o Portallupi é um poeta nas horas vagas. Finge tanto que acredita nas 'próprias palavras' jogadas ao vento. Quem garante, que no exílio das areias, não devorava livros de táticas, assistia escondidos jogos ou fugia para algum curso?
Este texto não é um pedido de desculpas. É uma tentativa de expurgar enganos, de rever conceitos, de dar uma nova chance, de procurar um outro olhar. Entendi que o fracasso de desajustados, de contestados, de rejeitados, pode ser apenas a antessala do sucesso. Basta tempo e confiança. Será que pensarei assim se o Grêmio apostar em mais um veterano em final carreira, já aposentado, fora de forma, que tomara o lugar de um guri? Se Renato continuar, sim. Se for outro treinador, as dúvidas, a incerteza, o medo, o fracasso, equívoco, voltarão. Eu só conheço um Midas, um salvador de almas, um recuperador de homens, um mito. Alguém conhece outro?

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