terça-feira, 17 de abril de 2018

O craque

 

"Quando achamos  a matemática e a física teórica muito difíceis, voltamo-nos para o misticismo"
Tento Stephen Hawking para entender a magia do craque. Mas, às vezes, prefiro acreditar num 'dom', um presente magnífico de Deus.

Mauro Pandolfi

O futebol tem um mistério que não consigo desvendar. O que chamamos de craque. Aquele que mantém com a bola uma relação extra-humana, poética ou libidinosa demais. A bola aninha nos seus pés, submissa, devassa.  Obedece os 'comandos', de um cérebo com pé ou de um pé com cérebro, numa magia que foge da realidade, do possível, do comum. Da janela do quarto do Pedro passei uma manhã tentando entender o 'nascimento' de um craque. Presto atenção nos meninos. Nos gestos, nos olhares, no domínio da bola. Parecem tão iguais nos gestos, nos olhares, no domínio.  Há lances maravilhosos, gols espetaculares, passes certeiros.  Jogam partidas que não tem fim. Já conversei com eles e nenhum deseja ser jogador de futebol. Um dos melhores que vi, Léo, abandonou a bola pela engenharia. Régua e compasso sempre fizeram parte do seu dia. O forte de Léo era o passe. Tão medido e preciso. Mas usará a régua e o compasso para inventar casas. Que pena!
Uso Stephen Hawking para decifrar o craque. É fundamental entender o espaço e o tempo. O bom jogador, às vezes, se perde na relação. Ou, não entende o tempo. Segura demais a bola ou livrá-se dela com muita rapidez. Ou, o espaço é um labirinto difícil de encontrar a saída. Perdido, não acha o caminho correto. Aí, sempre há um adversário atento e fica com a bola. Arthur, do Grêmio, é quem melhor equaciona tempo e espaço. Tem o tempo perfeito do lance. Não gasta um segundo a mais. Preciso, conciso, medido, categórico. Com a bola no pé deslumbra o espaço. Usa atalhos, inventa caminhos, sempre certeiro, sintético. Arthur é o grande craque do futebol brasileiro. Talvez, o melhor em sua função no mundo.  Percebo os 'risinhos' irônicos salientando o meu gremismo. No Barcelona confirmará o que eu digo.  Sairá da periferia para o centro. É uma mistura de Xavi e Iniesta. No entanto, verá a Copa sentado no sofá. Tite prefere os corretos, os obedientes, os que seguem os caminhos detalhados em sua prancheta. Tite ainda define os seus 'preferidos' por posição. Se não entende os movimentos, não convoca. Assim é, também, com Luan. Tite deveria ler 'A Teoria de Tudo', de Stephen Hawking, para descobrir que o futebol navega entre o movimento, o espaço, o tempo, a força, a energia. Ou seja, a física, a matemática, a vida.
Nem a chuva impede o 'balé' dos meninos. Estão todos lá. Há os que são força.  A maioria. Muita vontade, disposição, volúpia. Às vezes, são até brutos. Conhecem o seu espaço e tentam impedir o ingresso do rival. Não há tempo para eles. Livram-se da bola imediatamente. Quase raro, não há outro Léo por aqui, há quem gosta do passe, do movimento, da ocupação do espaço e usa o tempo com maestria. Geralmente, é deixado de lado. O driblador é o 'poeta' que ignora a física. Dribla na sua área, no meio e na área adversária. Ele e a bola. Detesta o tempo, o passe. Ama o espaço.  Tudo é infinito, todo campo é um latifúndio, que é só dele. É o primeiro a ser escolhido. O que é chamado de craque pelos outros meninos. O ensino brasileiro é um fracasso em matemática e ciências. Difícil entender e aplicar no dia a dia.  Isto explica o pouco caso com o 'passador' e amor ao driblador. Ele sempre acha um gol, a vitória, a esperança. Somos assim. Suspiramos por um salvador, alguém com o 'dom' para nos redimir.

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