Mauro Pandolfi
"O lance sobre o futuro...,
é que toda vez que você olha para ele;
Ele muda, porque você olhou pra ele.
E isso muda todo o resto"
é que toda vez que você olha para ele;
Ele muda, porque você olhou pra ele.
E isso muda todo o resto"
Frase do 'louco visionário' Philip K Dick, autor de Do Androids Dream of Electric Sheep? , livro que gerou o mais espetacular filme de todos os tempos: Blade Runner.
Pensava
que a vida era fácil. Apostei na sorte, no fortuito, numa roleta quase
russa. Acreditei em Fernando Pessoa. 'Viver não era preciso' era o meu
dogma. Vivi a ilusão de que o acaso iria me proteger enquanto estivesse
distraído. Que nada! Entendi, agora velho, que viver é preciso. É como
navegar. Entender os ventos para não se perder. Acho que bailei na
curva. Perdido nesta revolução, que achava silenciosa, ruidosa,
devastadora, transformadora, necessário, original. Os meus conceitos me
traíram. O que era verdade virou pó. E, não era pirlimpimpim. E, olha,
que Peter Pan nunca foi o meu complexo. Descobri que as fronteiras foram
escancaradas, demolidas, devastadas.. Perplexo, desiludido, agoniado, fui buscar
Rai Carlos, o vidente cego, para decifrar este enigma. Decifra-me ou te
devoro? Fui devorado em fatias, aos poucos, lentamente.
"Não
se assuste, Mauro. Vou usar um chavão para você entender. Não há nada
de novo sob o sol. Tudo estava previsto. Não como profecia. A vida
sempre
muda, se transforma, só assim sobrevive, se sustenta, não termina. Você
que ama o passado, que entende que estamos preso ao passado eterno, tem
de compreender, outro chavão, que o novo sempre vem. E, ele veio
brutal, avassalador. Estamos na Era de aquário. Mas, o cético aí, não
acredita, né? Que medo é este, meu querido?, disse-me Rai,
sorvendo o chimarrão. "O médico me proibiu o gim de manhã. Resgatei este
hábito. Queres um?". Pego a cuia e, lembro o que sempre esqueço, as
minhas origens. Achei que o Grêmio era o último resquício gaudério. Não
é!
'Estou
perdido, confuso , Rai. As fronteiras estão terminando. O que é
esquerda,
o que é direita? O que é certo ou errado? O bem e o mal? Homem e
mulher?
Gêneros e sexualidade? Este maniqueísmo balizava a existência. Era
fácil
se posicionar. A vida com dois lados. Um ou outro. E, agora? Como se
posicionar?'. A gargalhada de Rai acorda Pablito, o velho papagaio,
que perdeu a graça ao ficar velho. "Só come. Tem o olhar triste. O olhar
do fim. Precisa de carinho. Se posicionar? Este é o olhar antigo que
está sendo derrubado. A vida não é uma cobrança, uma luta ideologizada. É
para ser vivida, curtida, compartilhada. A moeda deixou de ser
parâmetro. Não há dois lados somente. Não é um jogo de cara ou corroa.
Pense num polígono infinito.. A vida tem este mesmo olhar. Tudo é
estranho. Por instantes, confuso. Depois, entra no ritmo, num rumo,
acomodamento, até ser sacudida outra vez". Rai me acalma os sentidos, os
pensares e o medo.
"Meu
caro Mauro, você não sabe o que te espera?.As transformações que não
verei ou sentirei. Em 2080 ou 2090 terminará a sociedade do trabalho. O
que prende o homem em múltiplas horas diárias será feito por robôs,
máquinas. Se sobrar emprego, será a criação das máquinas ou a supervisão
delas. A liberdade humana é uma realidade que logo virá. O que dirão os
socialistas e os capitalistas? Irão para as ruas berrarem contra elas?
Sem trabalhadores, sem consumo. A economia será passado. Só história.
E, o que o homem fará com o tempo? Eu não sei! E, como você, tenho
medo. Um medo que não me apavora. Me alegra! Os filhos de teus filhos
viverão 150 ou 200 anos, ou para sempre. Tanto tempo, uma eternidade,
que farão abandonar a ideia de ter filhos. Não terá mais nexo a
perpetuação através do outro. Será sempre do mesmo. Lembra do cyborg, o
homem de seis milhões de dólares? Hoje já usamos próteses para alguns
órgãos do corpo. Lá, no final do século, substituirão todo o corpo. A
vida é uma ficção científica. Não há limite para sonhar, inventar,
criar. Pena que não verei isto como Rai. Serei outro, sem as minhas
lembranças." Uma das poucas vezes que notei uma tristeza no seu olhar.
Vivenciar
o futuro. Como é esta magia? Sonho, devaneio, delírio, imaginação.
Questiono ele. " Quando era jovem o único momento na frente de um
televisor era para ver Jornada nas Estrelas. Gostava de ouvir ..'a
fronteira final. Onde o homem jamais esteve'. Eu queria ir lá. Descobri e
furar a fronteira. Invadir era o meu desejo. Entender a frase. Buscar
os sentidos que tem. Levei tempo para perceber que falava de liberdade,
igualdade, fraternidade. Além do amor, é isto que move a humanidade.
Para provar ou contestar isto. Com o tempo notei que a liberdade é azul,
a igualdade é branca e a fraternidade é negra. Três cores que movem a
minha vida. Me aproximou do Grêmio. Gostaste disto, não é Mauro?" Poxa!
Tudo acaba em Grêmio. Agora entendo, o que ele diz sobre o futebol. Não é
jogo. É paixão. Não vive de resultado. Vive de entrega, de ilusão, de
amor. Vou começar ver futebol assim.,
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