sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Heitor!

 

"Posso ser um novo Di Stéfano, mas não posso ser um novo Pelé. Ele é o único que ultrapassa os limites da lógica..."
Ah, como será fantástico se Heitor for um poeta bola. Não precisa ser um Pelé, Diego, Cruyff, o autor da frase, ou Mané. Ser um Renato Portalluppi é um sonho. Me contento com Luan, Éverton, Arthur, Maicon, Jean Pyerre, Matheus Henrique...

Mauro Pandolfi

No mês da bola, dos melhores poetas do futebol, chegou Heitor. Menino grande, bonito, filho da Mayara (não consegui convencê-la a trocar o nome para Geromel) e do Gláucio, meu sobrinho, é um sopro de vitalidade, luz, felicidade na família, nestes tempos sombrios. Heitor? Que Heitor jogou bola? Heitor, Heitor, Heitor!!! Procurei nos meus alfarrábios, no google, um Heitor no futebol. Tenho na lembrança um lateral de chute forte que jogou no Flamengo e Ponte Preta. Surgiu, jogou, sumiu, nem vestígios deixou. Achei um velho palestrino, um filho de espanhol, Etorre Marcelino Domingues, chamado pelos torcedores de Heitor. Ele foi goleador do Palestra, parceiro de Frienderich na Seleção, e ao se aposentar, tornou-se árbitro. Mais ninguém! Só se usou algum apelido ou uma identidade secreta. Não sei o motivo da Mayara escolher Heitor.Poderia ser Manoel, Diego, Édson. É o mês deles. Da poesia em jogo. Da arte do drible. Da invenção do passe. Da fantasia que ilumina a vida.
Édson, Manoel e Diego é o trio que o futebol se explica, apaixona, encanta, dilacera, torna-se religião, literatura, arte. Pelé, Garrincha e Maradona. Sete dias em que a estrela brilhante no céu era uma bola. Pelé é do dia 23; Garrincha, de 28 e Maradona, dia 30.  A Santíssima Trindade! Os três poderiam ter nascido bola. Deram vida a bola. Tornaram a bola o Santo Graal dos tempos modernos.
Pelé! O nome que não precisa de adjetivo. É um adjetivo! Basta citar...Pelé! Você já sabe do que se refere. Ele não inventou o futebol. Nem a bola. Mas, virou símbolo, referência, sinônimo. Pelé é um nobre. Um rei coroado algumas vezes. A primeira, aos 18 anos, em 1958. E foi  logo chamado de Rei Pelé! Ele é um mito! Mitologia não se explica. É, e pronto! Édson Arantes do Nascimento nunca conseguiu ser um cidadão comum. Pelé nunca deixou. Pelé jogava feito prosa. Do passe medido, da tabela, do gol, do pulo com o punho cerrado, socando o ar. É a melhor frase do futebol!
Vi um só jogo de Mané Garrincha. O último! O da despedida com a camisa da seleção contra o time de estrangeiros que jogavam no Brasil. Foi em 73. Verdes anos, pouca coisa para contar, muitas para sonhar. Lembro do lance. Garrincha parado. Corpo arqueado, nada que lembrasse um atleta. A bola presa no seu pé. Negaceou. Foi e voltou. O uruguaio Bunuel foi. Na volta, virou mais um João. A bola passou entre as pernas. As 150 mil pessoas vibraram com o drible derradeiro de Garrincha com a camisa da seleção. Aliás, com Pelé e Garrincha em campo, o Brasil nunca perdeu. Garrincha é um poeta. O homem que sucumbiu as tentações, ao amor e a paixão. Garrincha é o maior fantasma do futebol. Esta sempre presente num campo. Está no desejo do torcedor, na saudade de um velho amante da bola, num drible, num passe cruzado, num corte, no chute certeiro...na ausência da alegria. Todo jogo burocrático, sem graça, sem alma é uma outra morte do Mané.
Diego Armando Maradona! Eu não era mais um garoto. Já tinha escapado no exército, de Brasília. em 79. Vi pela primeira vez um jogo de Maradona num amistoso contra Alemanha. Não lembro resultado, nem vou pesquisar no google. Há um lance que de tempos em tempos relembro. Em todos os jogos que joguei tentei repetir. Belo demais! Alguns fiascos. Quando deu certo, virou gol. O lance é magia pura. Bola lançada pela direita. Longa, quase escapando. Maradona domina. Cercado, da dois passos em direção à linha de fundo. E, de letra, com o pé esquerdo, passando por trás do direito, cruzou. Os alemães ficaram atônitos e Ramón Diaz perdeu o gol. Nunca mais perdi Maradona de vista. Acompanhei a sua carreira, a glória, a tragédia pessoal, os equívocos, os acertos, a canonização, a humanização. Maradona tem algo de Pelé e muito de Mané. Que falta faz, este Diego!
O dia da poesia, 31, fecha o mês dos ilusionistas da bola que poderia ser definido assim: "Futebol se joga no estádio? Futebol se joga na praia, futebol se joga na rua, futebol se joga na alma" (pequeno verso de Carlos Drummond de Andrade também de outubro, uma espécie de Pelé, ou seria Mané, ou quem sabe Maradona, entre os poetas?). Vou dar uma bola para Heitor. Nunca uma camiseta. Ele vai escolher o time. Vou contar sobre os seus parceiros de mês, o trio que embala a minha paixão, brincar com ele, me divertir numa rua, praia, despertar a alma do futebol nele e quem, bem velhinho, vibrar com seus gols. 
Seja bem vindo, Heitor!

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