"Como todos os sonhadores confundi o desencanto com a verdade!"
Não
sei se concordo com Jean-Paul Sartre ao me referir a Paulo Henrique
Ganso. Tenho dúvida se o meu encantamento acabou com a realidade do
futebol ou a mudança do meu olhar sobre o jogo?
Mauro Pandolfi
Paulo
Henrique Ganso foi o 'craque' quem mais me encantou à primeira vista.
Nos primeiros lances com a bola. Nos lances sem a bola. A flutuação
entre as linhas. O espaço e o tempo. A cabeça erguida. O corpo reto. O
olhar que prevê o futuro. O soberano dono jogo. O incomum! O 'dez'
desenhado nas pranchetas e nas memórias de quem cultua o futebol. Um
Gérson, um Didi, um Rivelino, um Jair da Rosa Pinto, um Zizinho. Nomes
que conheço de ouvir falar, de leituras, de imaginários dos velhos
contadores de histórias. A genialidade de Ganso comprovei quando o
Santos eliminou o Grêmio na Copa do Brasil. Paulo Henrique foi soberbo.
Magnífico! Um dez antigo com todo o jeito de moderno. Era 2010, ano de
Copa do Mundo. Dunga rejeitou convocar Ganso e Neymar. Inexperientes,
tremeriam, disse o eterno aprendiz de treinador. Preferiu Júlio Batista,
Felipe Melo e Grafite. Cada qual com as suas escolhas. O ranço contra
jovens é permanente neste país. O resultado todos sabem. Sorte teve um
tal de Édson que nunca teve um Dunga como técnico.
Neymar
e Paulo Henrique Ganso. Aquele Santos parecia o lendário comandado por
Pelé. Insinuante, hábil, bem armado, ofensivo. Os dois resgataram a
glória do time 'da vila mais famosa do mundo'. Era um dueto. Um duelo.
Uma dupla. Parceiros e, de certa forma, rivais. Eu achava Neymar um
moleque abusado. Era disto que gostava. Ganso era cerebral demais. O
pensador me chamava a atenção. Aquele Santos gerou um monte de
'craques'. Todos desapareceram longe de Neymar e Ganso. E, Paulo
Henrique nunca foi o que prometia sem Neymar. Virou comum, lento, lerdo,
previsível. Vive procurando o tempo perdido. Ainda dá para encontrar.
Será?
Paulo
Henrique Ganso foi o desencanto mais melancólico que vi. Troquei jogos
do Grêmio pelo Santos para ver Ganso. Aquela genialidade foi
desaparecendo, sumindo. De fã, virei um crítico ríspido, ácido, sem
paciência com o jogo sonolento, antigo. Ganso tornou-se um velho camisa
dez. Estático. Esperava a bola chegar ao seus pés outrora mágicos.
Alguns lances ainda lembravam aquele insinuante meia. Eram escassos.
Quando brilhava queriam na seleção. Ainda lembram dele! Ou pela falta de
um 'dez' do sonho ou pelo encantamento platônico que resiste ao
desencanto?
O
futebol é um jogo de tempo e espaço. Nunca é o mesmo. Cria variáveis
todo instante. Já foi 'jogo de damas' e agora é de 'xadrez'. Simples e
complexo. O craque sabe interpretar o tempo e o espaço. Reiventa-se
sempre. Neymar fez isto. Cristiano Ronaldo e Messi, também. Luka Modric é
o exemplo de um dez moderno. Paulo Henrique Ganso parou naquele Santos.
Perdeu a volúpia (talvez as cirurgias nos joelhos sejam a causa), a
movimentação, a ousadia. Seu jogo ficou triste. Continua preso no seu
quadrado. Ainda esperando a bola chegar em seus pés. Raramente chega. Ao
chegar, o combate é imediato. Ele não entendeu o tempo. Não percebeu
que a bola corre mágica. Flutua, ainda poética, mas flutua. Nestes
tempos tecnológicos, feito de logarítimos, Paulo Henrique Ganso é
analógico. Como o Brasil vive em sua espiral histórica, com um sombrio
anos 60 no ar, os clubes apostando em medalhões decadentes, Paulo
Henrique Ganso procura o futuro que perdeu em alguma esquina do campo.
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