"Se
as pessoas não tiverem o poder de dizer as coisas,eu vou dizer por
elas. Quando era jogador, minhas pernas ampliavam a minha voz".
Sócrates era o jogador que pensava. O jogo e a vida. Genial, artístico, político. Um homem que faz falta em qualquer tempo.
Mauro Pandolfi
Ando
com saudade de Sócrates. Fucei no you tube e achei alguns lances que
alegraram a minha alma. Gols e passes. Vi um jogo completo e acompanhei a
sua movimentação em campo. Não sei se o Sócrates grego era físico além de
filósofo. O Brasileiro parecia um físico jogando. A movimentação, o
olhar, o andar não eram acidentais, triviais, ao esmo. Eram pensados.
Noção perfeita entre tempo e espaço. Certamente Stephen Hawking o
conhecia. Desconfio que algumas teorias sobre gravidade e tempo foram
baseadas na dinâmica de Sócrates, na sutileza e elegância de seus
deslocamentos. Não foi só o futebol que me deixou com saudades dele. Ao
ver Ronaldinho Gaúcho fazendo campanha para Bolsonaro lembrei do Magrão.
Socrates se manifestou contra a ditadura. Ronaldinho faz apologia ao
defensor da ditadura. Como pode alguém que vestiu a camisa do Barcelona
apoiar um fascista? Certamente, nas horas de folga, o 'gaúcho' preferia
seus pagodes a um bom livro sobre a história do Barcelona, da Catalunha
contra o fascismo franquista.
Sócrates foi
o meu ídolo de juventude. Tinha um poster dele no quarto. Durante algum
tempo sublimei a paixão gremista pelo Corinthians. Tempo da Democracia
Corinthiana. Metido a rebelde, eu gostava de quem desafinava o coro dos
contentes, que desafiava a ordem. Sócrates era o meu preferido. Amava o seu jogo. A cabeça
erguida, a falsa lentidão e a técnica apurada. Meu lance preferido era o
calcanhar. A sutileza e magia num átimo de tempo. Tão rápido, tão
desconcertante, tão artístico. Admirava o seu pensar. Não era um jogador
comum. Tinha algo para dizer, propor, sugerir. Irritou o
conservadorismo deste país. Velhos jornalistas - e nem tão velhos assim -,
amantes da opressão, das 'boquinhas', não o toleravam. Eram obrigados a
engolir pelo talento. Mas, sempre tinha um mas...
'Cervejeiro,
revolucionário, contestador, rebelde, jogador tem que jogar bola, não falar de
política'. Ouvi muito isto. Desliguei rádio, tevê, joguei fora jornais,
não suportava a estupidez conservadora da imprensa esportiva. Nunca fiz uma entrevista com
Sócrates. Com Paulinho Scarduelli gravei uma conversa com o psiquiatra
Flávio Gikovate, fazia parte da diretoria do Corinthians no tempo da
Democracia, sobre futebol, política, sexualidade, vida e,
principalmente, Sócrates. Anos depois, entrevistei Raí, que fazia a
estréia na Seleção Brasileira. Duas ou três perguntas sobre ele. Os
outros 20 minutos foram sobre Sócrates. Não resisti a idolatria.
A
vida foi cruel com Sócrates. Já tinha sido com Garrincha. O álcool foi
um marcador feroz com os dois. Foi íntegro até nas últimas horas de
vida. Recusou o privilégio de ídolo para um transplante. 'Só que é o
seguinte, eu tenho de estar na lista. Eu não furo fila, não. E eu não
estou em nenhuma lista", disse. No dia quatro de dezembro de 2011,
Sócrates morreu. Um triste domingo. Ele sempre foi um exemplo para mim.
Enquanto que Ronaldinho e seu irmão Assis foram denunciados por mau uso
de verba pública em um 'suposto' projeto social em Porto Alegre. É! O futebol dá
para comparar. Já o caráter, não!
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