"Devo tudo ao futebol. Joguei por 30 anos, nunca tive uma contusão. Deus só mandou a conta agora!"
O lamento do Deus Único, Pelé, em ter que conviver com as dores e a mortalidade de Édson Arantes do Nascimento.
Mauro Pandolfi
O
'exílio' tem as suas vantagens. O silêncio, as reflexões, as leituras,
os filmes, as músicas, as lembranças, a melancolia. Numa noite de
insônia, vagando pela televisão, achei a entrega da Bola de Prata. Um
fascínio que vem dos tempos de guri, leitor ávido de Placar, sonhador,
amante da bola. Na Bola de Prata vivenciei nomes que povoaram a minha
infância. Onde estarão Aranha, Carlindo, Louro, Beto Bacamarte, Alberi e
Osni? Ganhadores do troféu, figurinhas nos meus times de botão, que
desapareceram sem deixar vestígios. O homenageado da Bola de Prata deste
ano foi Pelé. Tudo girou em torno de Pelé. Histórias, entrevistas,
imagens, feitos, fatos, magia do único Rei que a bola - e os homens do
futebol - reconhece. Ele não pode aparecer ao vivo. Ao comentar o seu
drama de saúde, Pelé não parecia Pelé. Era o Édson. Frágil, mortal,
comum. Pelé não tem medo da morte. Édson, sim! Sabe que um dia vai
embora. Ainda bem que Pelé é eterno!
Na
manha seguinte a notícia que me deixou triste durante toda a semana. A
morte de Tarciso. Ele era rápido. Muito rápido. O 'Flecha Negra',
majestoso apelido dado pela voz do gol: Milton Ferreti Young. Tarciso
foi o melhor homem a jogar com a sete do Grêmio. Renato não conta. Ele é
uma espécie de Deus, um Zeus supremo na mitologia tricolor. José
Tarciso de Souza foi o mais gremista de todos os jogadores que
desfilaram com a linda camiseta tricolor. Sobreviveu aos anos vermelhos,
do imenso time que teve Falcão e Carpegiani. Figueroa o parava com o
cotovelo. Ele resistiu as críticas de uma torcida sufocada pelas
derrotas. Gigante, Tarciso foi o emblemático craque de 1977 - perdeu
pênalti no Grenal decisivo -, destruiu a defesa colorada e viu André
alçar o voo da liberdade, orientou Baltazar e os meninos em 1981 e no
sagrado ano de 1983 conduziu o Gêmio de Montevidéu até Tóquio. Tarciso
era muito rápido no campo. Infelizmente, também, na vida.
Não
vi a entrega da Bola de Ouro. Troféu justo para Luca Modric. O maestro
de um novo jeito de brincar com bola. Sabe como poucos alternar o ritmo
do jogo. Não vi Lionel entre os primeiros. Ficou em quinto. Pensei com
os meus botões, chegou ao fim o tempo de Messi? Passei dois dias
pensando em Messi. Escutei até alguns tangos para alimentar a melancolia
e a tristeza da finitude de Messi. Mas, domingo de manha, no teipe da
ESPN, vi Messi. De rosa, tão genial, tão inspirado, tão poético, tão
prático, ele continua espetacular. Preciso, soberbo, soberano, genial. O
mais Pelé depois de Pelé. Entendi a mortalidade de nós, os homens
comuns, e imortalidade que gregos e romanos falavam de seus deuses.
Sempre haverá um vídeo, uma história, uma lembrança, sobre Pelé e Messi.
São para sempre.
O 'exílio' tem as suas desvantagens. A solidão, as ausências, a saudade, a melancolia, as lembranças.
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